A música pop de hoje é um retrato da globalização. Assim como muito boa e muita coisa ruim pode bombar na internet, rádios, TVs e festivais de música todo o planeta (vide o sucesso mundial do brasileiro Michel Teló com o hit "Ai, se eu te pego}" e do coreano Psy com seu Gangnam Style). Hoje em dia com o youtube, o itunes, as redes sociais e uma multidão de sites, blogs e aplicativos, pode-se escutar de tudo, do mundo inteiro, em qualquer lugar. Daí o sucesso mundial de cantoras como Lorde.
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De qualquer forma, o estrondoso (e rápido) sucesso de Lorde ainda encanta e espanta. Imagine uma adolescente branca de 17 anos, de olhos graúdos e ainda com espinhas no rosto, ostentando uma vasta cabeleira ruiva, com um namorado nerd magricelo com cara de japa, vivendo numa ilha no meio do Oceano Pacífico, distante de tudo e de todos e há pelos vinte e oito horas de avião de qualquer lugar civilizado. Essa é Ella Yelich-O'Connor, cantora indie de Davenport, localidade na área metropolita de Auckland, na Nova Zelândia, mais conhecida pelo seu nome artístico de Lorde. Divulgada inicialmente em vídeos na internet, não demorou para que a garota galgasse o estrelato, arrebatando diversos prêmios da indústria da música no ano passado e tocando ao vivo recentemente na edição brasileira do Festival Lolapalooza, realizado na cidade de São Paulo, neste final de semana. A garota ganhou o Grammy de melhor canção e melhor performance do ano, com o clipe da música Royals, divulgada à exaustão em canais como a MTV e o VH1. É uma cantora de voz lapidada, suave mas sensual, revelando a potência de alguém com muito mais idade do que aparenta ter. Lorde chegou em 2013 para suceder Adele como grande diva do pop mundial, após lançar seu primeiro e único disco até agora, Pure Heroine, que é de uma qualidade impressionante.
É bem verdade que não podemos esquecer que se trata apenas de uma jovem de 17 anos, revelando em suas letras os desejos pueris e até certa inocência por quem já passou por essa tenra idade. Mas Lorde tem conteúdo, levando-se em conta ser considerada pela família uma garota superdotada, que desde pequena gostava de livros e lia romances inteiros de Raymond Carver e T. S. Elliot. Filha de uma dona de casa que já ganhou um concurso nacional de poesia e de um engenheiro, a pequena Ella pode não ter vindo de uma família de tradicionais músicos clássicos, mas nem por isso, em sua suburbana vida de classe média, pode-se dizer que os familiares de Lorde não a tivessem influenciado com boa leitura e boa música. Foi assim que a artista foi se fazendo precocemente, aos poucos, lapidando um som meio lounge, no estilo Portishead, que veio a ser marca característica da cantora neozelandesa.
Apresentação em Seattle em 2013. |
Escutei todas as faixas de Pure Heroine, e apesar de considerar algumas repetitivas, achei no total um disco muito bom. O bom senso da produção de Joel Little revela uma cantora intimista, com uma pequena e discreta pegada soul, que faz parecer canções como Royals feitas sob medida para uma menininha adolescente que questiona na sua letra o consumismo exacerbado de sua geração, tornando-se um hit instantâneo nas rádios e na televisão. Destaque também para 400 Lux, para mim, segunda música do álbum, e, certamente, uma das mais bonitas, boa para se ouvir no carro enquanto se está dirigindo, bem no estilo de bandas como Massive Atack ou Morcheba. Outras canções que merecem destaque são Buzzcut Season, Team e a intimista World Alone e a possante e viajante Glory and Gore.
Como se trata apenas do seu primeiro disco, acredito que Lorde ainda tenha muita munição para queimar. Vale aqui o destaque de ter a boa nova de ouvir mais uma boa cantora, que não se prende ao remelexo de certas divas, metidas a piriguete, que com coreografias cafonas ou duvidosas, querem se mostrar ao mundo não somente pela sua música, mas também pelo seu corpo, o que não é propriamente a minha praia em termos de gosto musical. Entre loiras de cabelo curto penduradas peladas em cima de uma bola de ferro e uma adolescente ruivinha que parece ter sido tirada de um seriado de Big Bang Theory, prefiro a segunda Que seja bem vinda a jovem Lorde ao mundo do estrelato musical e que sua música amadureça, assim como ela própria.