quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

EDUCAÇÃO: Onde os Especialistas não tem vez!

Participando de uma recente reunião docente na instituição de ensino onde leciono, fui informado pela coordenação do curso que os professores que tinham apenas o título de especialista não teriam turmas nesse semestre. A alegação da faculdade foi que as orientações do MEC para as instituições privadas de ensino superior no Brasil, este ano, seria a de que todo o corpo docente das instituições deveria ser formado por mestres e doutores; e que, além disso, tais professores só poderiam lecionar disciplinas que tivessem aderência; ou seja, fossem formados ou pós-graduados, especificamente para aquela área de conhecimento. Isso implica em dizer que um professor com mestrado em Direito Tributário, somente poderia lecionar a disciplina do mesmo nome, e nunca Direito Processual ou qualquer disciplina de Direito Público, enquanto que um profissional com pós-graduação em Direito Penal não poderia dar aula de Direito Constitucional e vice-versa.

Percebi a celeuma que tais medidas adotadas pela faculdade tiveram numa série de professores especialistas da casa (o que não é o meu caso); mas não deixei de me solidarizar com um corpo docente de professores jovens e esforçados, que foram responsáveis pelo erguimento do curso, nos primórdios da faculdade, e que agora estavam sendo colocados de lado, jogados ao escanteio, pelo fato de não terem uma pós-graduação strictu sensu. Percebi  que parte das demandas do Ministério da Educação tinha haver com a necessidade de se cobrar um maior empenho e qualidade acadêmica dos cursos jurídicos das instituições de ensino privadas, de nível superior. O que é louvável. Mas, percebi que, nas determinações do MEC, ao menos no que tange à aderência de discipllina, algumas injustiças ou mesmo impropriedades acadêmicas foram cometidas.


Para o filósofo Edgar Morin, esse papo de
"aderência" do Ministério da Educação,
na exigência de qualificação de professores,
é conversa fiada!
 Edgar Morin, pedagogo de fama mundial reconhecidíssima e filósofo da teoria da complexidade, diz que a multiplicidade de formações técnicas num diálogo entre conhecimentos faz com que haja uma pulverização das especializações, onde cada um tem que conhecer um pouco de cada coisa. Chama-se a isso de transdiciplinariedade, algo que vai se encontrar presente na pedagogia de Morin e que irá nortear as técnicas de ensino mais modernas. Desta forma, pela pedagogia transdiciplinar de Morin, o papel da escola é propiciar a comunicação entre as diversas áreas do saber, a fim de possibilitar a liberdade criativa que a ciência proporciona, com seu leque de possibilidades, e, desta forma, construir um conhecimento mais rico e diversificado, levando em conta as várias áreas do conhecimento estudadas conjuntamente. Nos termos apontados pela transdiciplinariedade, o propósito de "aderência" defendido pelos think tanks do MEC, não faria o menor sentido. Para que um profissional é obrigado a aderir a determinada área, ficando preso num âmbito de conhecimento, se  a ciência é multidisplinar e pode envolver várias formas de saber? Será que um professor especializado em Direito Econômico não poderia, por exemplo, dar aulas de Direito Penal, enfatizando na disciplina o conteúdo dos crimes econômicos? Ou será que um constitucionalista não poderia lecionar Direito Civil, se toda a legislação civilista encontra-se presa a dispositivos constitucionais?

Compreendo que deve ser cobrada a contrapartida das instituições privadas no tocante à excelência do ensino, tendo em vista a autorização do MEC para o seu funcionamento. Muitas faculdades e universidades privadas recentemente criadas ou desenvolvidas nas últimas duas décadas já lucraram muito e ganharam muito dinheiro. Afinal, está na hora dessas instituições mostrarem serviço e revelarem sua relevância pública, formando alunos bem formados. Entretanto, creio que isso não pode ser feito simplesmente demitindo-se professores especialistas, ao invés de lhes ser dada a oportunidade de capacitação, através de mestrados e doutorados incentivados pelas próprias instituições de ensino onde esses profissionais trabalham. Ter uma instituição de ensino bem avaliada, com uma grande produção técnico-científica, repleta de professores mestres e doutores, é o sonho de qualquer empreendedor educacional e reitor de universidade minimamente comprometido com a edução; mas o caminho até chegar a isso depende do aproveitamento e valorização do corpo docente que ainda é especialista, a fim de que esses profissionais do ensino obtenham a reconhecida e desejada titulação. Não creio que mandar jovens especialistas para o olho da rua contribua para o aprimoramento da educação de nível superior nacional, e, pelo contrário, acredito que isso possa gerar um coro de ressentimentos que faça com que muitos profissionais frustrados deixem de lecionar, apesar da vocação despertada em sala de aula, e, desgostosos, venham a desempenhar outras atividades. É uma pena! Quando comecei a lecionar ninguém me disse que para entrar numa sala eu tinha que concluir um mestrado ou doutorado primeiro, mas sim que precisavam de alguém que soubesse (e gostasse) de ensinar. Apesar disso, e para aqueles que entendem que ensinar é uma arte, mais do que uma profissão, não esmoreçam! O verdadeiro artista muitas vezes não tem sua arte reconhecida, mas acaba por criar belas obras, de qualquer forma, pois seu ofício de artista o obriga a criar. Traduzindo essas palavras: estudem e ensinem, meus caros professores especialistas, dediquem-se à profissão que escolheram e se pós-graduem, pois o reconhecimento profissional, mais cedo ou mais tarde, irá acontecer!

Parodiando o romance célebre de Cormac McCarthy , cuja versão cinematográfica rodada pelos irmãos Cohen ganhou até Oscar com o ator espanhol Javier Bardem, se o título inicial do livro No Country for Old Men fosse aplicado à realidade dos professores especialistas nas instituições de nível superior do país, eu diria que, no Brasil, para o Ministério da Educação: No Country for Specialists! What a Shame!

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