quarta-feira, 5 de setembro de 2012

CULTURA: A vida aos 70 anos.

Ontem, ao sair do trabalho e conseguir dar uma escapulida antes das aulas, fui até a livraria tomar um café e comprar uns livros, e entre uma xícara e outra tive a grata surpresa de encontrar o amigo Jarbas, professor da universidade e poeta, que do alto de seus quase 70 anos, já lamentava o fato de ter que se aposentar compulsoriamente da atividade docente, por conta de uma imposição legal. Além de mim e de Jarbas, estava lá outro amigo, jornalista e blogueiro, compondo uma pitoresca mesa servida de um aconchegante café, numa roda formada por senhores de diversas idades: eu, um quarentão, meu amigo jornalista cinquentão e Jarbas, quase um setentão, falando animadamente dos mesmos assuntos em um lugar que, por seu ambiente, não podia deixar de ser outra coisa; senão sobre poesia, literatura e cinema.

Madadayo: No filme de Kurosawa,fazer 70 é motivo de festa.
O professor Jarbas informou-me de uma louvável iniciativa sua, a ser realizada antes de sua indesejada  aposentadoria, que se tratava de promover cultura para os mais jovens e mais pobres por meio da arte cinematográfica, levando o nome do projeto o de um filme de um cineasta japonês que Jarbas muito apreciara. Assim, o "Projeto Madadayo" veio ao meu conhecimento, trazendo no nome a mesma história do personagem com quem o meu amigo professor, já idoso, muito se identificava. Pra quem não sabe, Madadayo foi o último filme do célebre diretor de cinema japonês, Akira Kurosawa, de 1993, antes de sua morte, cinco anos depois. O filme é baseado na história real do professor Uchida Hyakken, que de forma bem-humorada, despediu-se de seus alunos antes da iminente aposentadoria, realizando festivas comemorações de seu aniversário, sempre rodeado de estudantes, quando então lhe perguntavam após cada caneca de cerveja emborcada, a seguinte frase: Mada Kay? ("Pronto?"). Pelo que o velho professor respondia já embriagado, Mada Dayo! ("Ainda não!"). Afinal de contas, muito de nós ainda não estamos prontos para abandonar o que mais gostamos de fazer, só porque completamos 70 anos.

Paul fez 70 e se depender dele faz shows até os 100.
Na revista Veja desta semana, no artigo escrito pelo jornalista Roberto Pompeu de Toledo (um dos poucos que prestam naquela publicação), criticou-se a aposentadoria do ministro do STF, Cezar Peluso, justamente no meio do julgamento do processo do Mensalão. O jornalista lembra que em outros tribunais do mundo, como a Suprema Corte dos EUA, os seus ministros tem cargos vitalícios, só podendo se aposentar se assim o desejarem ou se não apresentarem mais mínimas condições de saúde para ainda julgar, sendo que um dos últimos magistrados a se aposentar recolheu-se aos 90 anos. Vê-se que no século XXI já se adotou o discurso da longevidade,  com o aumento da qualidade e da expectativa de vida do brasileiro, as novas revoluções da medicina, com novos medicamentos que retardam o envelhecimento, além da pregação de uma cultura corporal baseada em uma vida saudável, numa prevenção dos mais jovens aos efeitos deléterios da velhice e o surgimento de doenças, a partir do regramento da alimentação.

Hoje, quando digo que meu pai tem 69 anos e está perto de completar 70, mesmo com seus problemas de sáude, vejo pessoas de diferentes idades dizerem de forma bem trivial:"Ahhh! Ele é novo ainda!!". Entendo que por "novo", eles devem estar entendendo não a juventude em si (um atributo que envolve uma relação direta entre idade e saúde física), mas sim, em termos comparativos, a juventude comparada com quem já tem mais 100 anos (e já não são poucos os que apresentam essa marca impressionante de vida). É lógico que para meu pai é lisonjeiro saber que muitos ainda acham que ele ainda não está velho, em relação a outras pessoas mais idosas que já se aproximam da idade das tartarugas. Porém, acima da discussão sobre o aumento da expectativa de vida, creio que o que vem à tona em nossa cultura é a forma como estamos encarando a velhice e a passagem do tempo. Cada vez mais estabelece-se a crença de quem chega aos 70 anos não chega, necessariamente, ao final da vida.

Caetano e os seus 70 bem vividos anos.
Quando a expectativa de vida do brasileiro médio não passava de 65 anos, estabelecia-se que alguém chegar aos 60 já estava no lucro, pois tinha conseguido muito ao chegar até lá. Imagine os efeitos colaterais disso para quem tinha menos idade. Um quarentão, na época, poderia ter o mesmo status que tem hoje os homens de 60 anos, tratado como "tio" pelos mais moços ou até "vovô" pelos mais jovens ainda, tendo em vista que em tal idade, as marcas definitivas da maturidade já haviam chegado. Hoje, ao contrário, aos 60 anos os homens e mulheres são chamados a uma manutenção de si próprios, com mais cuidados sobre o corpo, uma maior vaidade e higiene, refletindo sobre a saúde e a beleza. Basta ver o frisson causado nas telas com as personagens calientes interpretadas pela atriz da rede Globo, Eliane Giardini (agora uma bela sessentona), nas novelas que ela participa. Mulheres maduras e que já chegaram aos 70 anos, como as atrizes Suzana Vieira e Catherine Deneuve, são mais um exemplo de como as mulheres aprenderam a se cuidar, ao chegar na terceira idade. Para não ficar apenas no mundo das celebridades de Tv (que tem muito botox pra pagar), temos na política mulheres que também estão chegando a marca dos 70, como a secretária de estado norte-americana, Hillary Clinton, ou a senadora paulista Marta Suplicy. Ambas no auge da forma física, da maturidade e do vigor político. No cinema, temos o  ator norte-americano dos filmes de ação, Chuck Norris, dando sopapos aos 72 anos, no recente filme do Stallone, Os Mercenários 2. Quanto aos homens, na música, vimos recentemente alguns de seus maiores ícones na MPB, como Gilberto Gil, Milton Nascimento e Caetano chegarem bem e criativos aos 70 anos. O cantor Roberto Carlos já passou dos 71, e assim como seu amigo Erasmo, continuam na ativa. O que dizer então do ex-Beatle Paul McCartney, sensação no primeiro semestre deste ano com um show em Recife, ou dos integrantes dos Rolling Stones, todos que já acenderam ou estão prestes a acender a septuagésima velinha?

Fico com meu amigo Jarbas, com meu pai e com todos os septuagenários do mundo, saudando-os em alto e bom som: bem vindos aos setenta!!  Que enquanto houver vontade e sopro de vida neste corpo, possamos utilizá-lo da melhor forma possível, como Deus nos deu, aproveitando nossos talentos e intelecto, a fim de produzir coisas boas para nós mesmos e para aqueles que nos rodeiam, independente da idade. Só espero cuidar da minha saúde o suficiente e que o Papai do Ceú tenha piedade de mim, permitindo-me chegar vivo e bem até a idade dos senhores gentis com mais de sete décadas de existência, a que me referi neste artigo. Afinal de contas, a vida só acaba na hora certa, e isso não quer dizer que ela vá terminar de uma vez por todas, só porque você já viveu por sete gerações. Quem sabe quando eu estiver com essa idade, eu não escreva de como é divertida a vida aos 80?? Viva até lá e você verá!!

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