quinta-feira, 13 de setembro de 2012

DIREITO: Metas, metas e metas-tudo pelo dinheiro (ou o caso da AMBEV de obrigar seus funcionários a passar óleo em prostitutas).

O capitalismo é o sistema que vivemos, e ao menos que você more no planeta Marte ou na Coréia do Norte, dele não podemos escapar. Não obstante vivermos num sistema capitalista, isso não implica em gostar dele, e apesar de todas as vantagens de sucesso, lucro fácil e ascensão social do pensamento liberal, sabemos das mazelas e consequências nefastas da manutenção desse sistema.
Recentemente, um microempresário curitibano ingressou com uma ação trabalhista contra seu antigo emprego, a AMBEV, denunciando que a empresa teria praticado assédio moral contra ele, quando ele ainda era empregado, sendo obrigado a participar de reuniões de motivação, onde seus integrantes assistiam shows de strip tease, viam filmes pornográficos, e eram obrigados a passar óleo em prostitutas. Tudo em prol da lógica do mercado. Ah, tá!!
Imagem divulgada na imprensa
O discurso motivacional é típico da estratégia das organizações capitalistas. Embalada pela pregação da ideologia liberal da livre iniciativa e da livre concorrência, a estratégia das empresas é a de fazerem seus empregados produzirem a qualquer custo. Afinal, a acumulação de capital só se dá com exploração de mão-de-obra, como dizia o filósofo e economista alemão, Karl Marx; e para a empresa capitalista lucrar, seus trabalhadores explorados tem que ser produtivos. Produção leva a lucro, mas o lucro a qualquer preço contamina o processo de produção, tendo em vista que não é visto o lado humano, a dignidade das pessoas, mas apenas as cifras, a comprovação do atingimento de metas da produção. Nesse sentido, pessoas viram números, tornam-se também mercadorias, e na "fetichização da mercadoria", definida pelo pensador acima citado, os empregados de uma empresa também são coisificados, tratados como mero joguete, uma mera peça de tabuleiro ou um animal domesticado, que mediante a satisfação do instituto sexual, pode começar a produzir.
Acho tragicômico o que aconteceu em Curitiba na Ambev, comparando a lógica dos proprietários da empresa com a dos fazendeiros. Se é para fazer o boi produzir, reproduzindo com as vacas, ele tem que ser estimulado, assim como os galos na granja tem que ser convidados a copular com as galinhas. Nessa lógica institiva da reprodução dos seres vivos, segundo o que diz os autos do processo trabalhista que correu contra a Ambev na Justiça do Paraná (dando ganho de causa para o referido funcionário), a grande empresa brasileira fabricante de cervejas constrangeu vários de seus funcionários, obrigando-os a participar de um ritual patético, de conteúdo sexual, tão e simplesmente para aguçar a libido de alguns supostamente seduzidos pela proposta, que ganhariam um "vale-programa" caso atingissem a meta de vendas pretendida pela empresa, podendo levar para a cama uma das belas garotas, que nua ou seminua, insinuava-se mediante o  cash  da Ambev para estimular seus funcionários a trabalhar mais.
Não se trata aqui de mera moralidade, mas sim de se estabelecer um direito configurado em lei, de que o trabalhador ou empregado de uma empresa, não pode ser submetido a tratamento desumano ou vexatório. Na própria imprensa que divulgou o fato, tentou-se descredenciar o argumento do ex-funcionário litigante, alegando que ele era evangélico, e que por isso teria entrado com uma reclamação trabalhista, pois tal episódio, supostamente, teria ferido sua moralidade religiosa. Na verdade, ao se fazer referênciaas a religião de alguém, nesses casos, tenta-se descredenciar o debate. Sabe-se agora que nas ditas reuniões motivacionais dos empregados da Ambev com prostituas, não havia somente pessoas evangèlicas que se sentiram constrangidas com tanta baixaria, mas até mulheres, trabalhadoras da empresa, que foram obrigadas a assistir um espetáculo patético de pura falta de bom senso do administrador capitalista. Nessa hora, a busca de metas numa empresa privada fugiu da ética e assumiu o caminho da ilegalidade.
O que dizer então do ensino superior, na mercantilização do sistema educacional por meio de faculdades e universidades particulares. Hoje, em detrimento da produção de conhecimento e da formação da ciência, alunos de graduação ou estudantes de pós-gradauçao são convidados a participar de congressos, conferências, e eventos, em sua maioria montados no segundo semestre de cada ano, somente para completar as horas que necessitam para concluir seus cursos, sem o mínimo de debate acadêmico, propondo professores, com a maior cara de pau, que todos os docentes que participarem desses eventos e pagarem por eles, estarão livres de provas ou ganharão pontos só por terem participado (leia-se, efetuado o pagamento) do evento. Pelo capital, em prol do lucro fácil ou em busca da formação de riqueza, busca-se tudo para que uma empresa possa atingir suas metas de produção e assim encher os bolsos do empreendedor capitalista. É a lógica do tudo pelo dinheiro!
Assim, acredito que existem princípios inabaláveis na Constituição, como a dignidade humana, que, não obstante a mesma Constituição defender os valores da livre iniciativa (até por iniciativa dos legisladores constituintes de linha liberal que fizeram parte do seu texto), não podem sobrepujar a dignidade das pessoas, principalmente no que tange a aspectos morais e afetivos. Além de ser de um profundo mau gosto estimular trabalhadores a fazer sexo com prostitutas, caso estes vendam mais os produtos de uma empresa, é de uma flagrante inconstitucionalidade submeter alguém a tratamento tão degradante do ponto de vista moral e da saúde pública (por conta das doenças sexualmente transmissíveis que podem ocorrer com quem se vale da prostituição), ou mesmo de presenciar isso, principalmente num ambiente de trabalho. É o Código Penal que estabelece ser crime, induzir alguém a satisfazer a lascívia alheia, segundo o art. 227, podendo o infrator pegar uma pena de até 3 (três) anos de reclusão. Havendo isso, será que os chairmen da Ambev, perceberam a bronca que estavam entrando?!
O problema é que houve uma interpretação cultural burra, por parte do setor de recursos humanos  de uma empresa acusada das barbaridades, como as apontadas acima, por achar que, em termos de marketing, cerveja no Brasil está associada diretamente com sexualidade, ou mais precisamente, com mulher pelada, gostosona ou seminua. Além da visão extremamente machista e instrumentalizante da figura da mulher, a estratégia da propaganda de cerveja associada a mulher bonita, não vende a ideia de que cerveja é igual a sexo porque no campo dos fatos, o argumento implícito na propaganda não se sustenta. É muito mais fácil associar erotismo com o vinho, por exemplo, que é uma bebida mais refinada, fermentada como a cerveja e mais embriagante, do que com a cerveja, porque sob o efeito do vinho, já dizia o filósofo Schopenhauer, até o mais tímido dos tímidos se torna o mais voraz dos amantes. Ocorre que o consumo de vinho é uma tradição das elites em países latíno-americanos, e a bebida rubra ainda está associada com a religião, principalmente no que tange à comunhão da ceia em muitos templos religiosos, não permitindo pela moral pública que propagandas que vinculem vinho com sexo sejam divulgadas. Já com a cerveja o caso é diferente, e depois do sucesso de algumas propagandas envolvendo homens viris (ou nem tanto, como o "Baixinho da Kayser") ao lado de mulheres bonitas, convencionou-se associar o consumo de cerveja com o bon vivantismo da mulher bonita do lado, bebericando junto com o afortunado consumidor da cevada de uma caneca de chope. O exagero resulta quando se confunde cerveja com prostituição.
Mensagem do Homer para a Ambev.
Assim, para os incautos representantes da Ambev, surpreendidos com uma ação judicial que, mediante sua divulgação na mídia, provocou uma reação da opinião pública contrária aos métodos de "motivação" da empresa, só digo que estes senhores deveriam tomar cerveja demais e fazer bobagens de menos, evitando práticas distorcidas que não ajudam ninguém, e somente contribuem para destruir a credibilidade de empresas firmadas no mercado há muito tempo. Como consumidor, continuarei bebericando minha cerveja nos finais de semana, assim como nos tempos frios apreciarei um bom vinho, mas sem que isso importe na minha degeneração moral, e nem que eu seja obrigado a associar uma bebida gelada com sexo frenético com profissionais do setor. Uma boa indenização judicial e um pouco de vergonha na cara cai bem, no caso dos intrépidos senhores que só querem ver a cor da grana, mesmo que isso custe a vergonha e a dignidade de milhares de pessoas. Pague o que deve, Ambev!

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