Recentemente, vimos mais um piloto brasileiro vítima de um acidente grave no circuito da Fórmula 1, no triste episódio envolvendo o corredor da Ferrari Felipe Massa. Dessa vez foi até pior, pois o acidente foi causado, inadvertidamente, por outro piloto brasileiro. No caso, um dos mais azarados, caso do nosso anedótico Rubinho Barrichello.
Por pouco não vimos se repetir a tragédia de 1994, na malfadada curva Tamborello, no circuito de Ímola, onde a vida de Airton Senna foi tragicamente ceifada no fatídico 1º de maio daquele ano, quando o veículo pilotado por Senna espatifou-se numa parede de concreto, lançando a barra de suspensão no ar, como uma lança certeira, diretamente no crânio do ídolo brasileiro das pistas, tricampeão mundial, como se fosse uma cena do filme de terror Premonição, quando a morte acontece das formas mais incríveis e inusitadas. Lembro-me que eu estava numa manhã de domingo na casa de um casal de amigos, jogando uma prosaica partida de xadrez, com a televisão ligada, entretido com o tabuleiro, quando todos nós fomos surpreendidos por um fato inacreditável. Pela primeira vez na história um piloto de corridas brasileiro morria nas pistas de Fórmula 1, no auge da popularidade, em plena atividade. Há cerca de quatorze anos antes, outro piloto brasileiro consagrado nas pistas, José Carlos Pace, também morria tragicamente, só que fora de um carro de corrida, num terrível desastre de avião. O impensável acontecia conosco, brasileiros, num cinematográfico drama automobolístico. Automaticamente galgado à posição de herói nacional, vimos seu caixão ser conduzido por multidões quando da chegada de seu féretro em São Paulo, repetindo uma comoção nacional até mesmo maior que o enterro de um recém-eleito presidente Tancredo Neves em 1985, ou do suicida Getúlio Vargas, décadas antes. "Nunca antes nesse país", no bordão característico de nosso presidente Lula, havia se enterrado um brasileiro, campeão mundial de Fórmula 1. O mesmo Barrichello que conduziu o caixão do ídolo morto, foi a testemunha e indiretamente responsável pelo acidente que vitimou dias atrás o piloto Felipe Massa.
As pistas são traiçoeiras, pois esse é o risco da velocidade, e mesmo com todas as precauções e medidas de segurança cabíveis, com o emprego cada vez mais crescente de altas tecnologias, é impossível prever o imponderável e o que pode acontecer com um piloto de corridas, cada vez que ele entra no cockpit. O acidente de Massa só não foi mais trágico e mortal, porque com o emprego de novas substâncias na montagem de capacetes, foi possível atenuar um impacto que poderia ser ainda pior, amortecendo a semiblindada viseira do capacete de Massa, a mortal peça de veículo que o acertou em cheio.
Em nossas conexões entre o passado e o futuro, num caso de coincidência macabra, Felipe Massa também foi vítima de uma peça de carro, transformada em bólido mortífero tal qual uma bala de revólver, quando a mola propulsora do veículo de Barrichello, soltou-se do chassi, vindo a ser arremessada diretamente na cabine do desafortunado piloto que vinha logo atrás (no caso, o infeliz Massa), atingindo-o na viseira e provocando não só a rachadura do capacete, como também uma lesão no crânio do piloto, ameaçando até sua visão.
Nunca fui muito fã de corridas e nem de Fórmula 1, pois acredito que isto é uma questão cultural, que vem de formação, coisa de berço. Sei de muitos que são tão fissurados em corridas que se tornam praticantes de ralis, esportes radicais, e tornam-se adeptos de trilhas, chafurdando na lama de moitas e florestas, com seus jipes, em ritmo de aventura. Louvo isso, acreditando que isso até faz bem à saúde, ao lidar com um pouco de adrenalina, apesar de não ser minha praia. Entretanto, enquanto outros guris, na minha infância, brincavam de autorama, eu preferia meus jogos de tabuleiro ou montar meu forte apache, imitando os filmes de faroeste, do que ficar plantado no chão, vendo carrinhos de brinquedo elétricos correndo para lá e para cá. Bueno! Gosto não se discute!
Agora o que mais me acha a atenção é o prazer quase erótico que suscitam as corridas de automóveis. Além dos milhões proporcionados pelos patrocinadores, belas mulheres entre os boxes, a fama e o glamour adquirido com as corridas, eventos como a Fórmula 1 traduzem um esporte midiático tão assistido mundialmente quanto o futebol. Assim como os gladiadores da arena, no coliseu romano, assemelhavam-se aos jogadores de futebol, creio que os competidores de fórmula 1 equivalem aos antigos corredores de bigas, tão presentes na Antiguidade e muito bem retratados no clássico filme Ben-Hur, com um Chalton Herston ainda jovem fazendo a turba vibrar com suas manobras radicais, em sua carruagem romana. A emoção das corridas de automóveis é a emoção do perigo, o suspense em cada curva, pela expectativa mórbida ou atroz de ver os pilotos desafiando as leis da física, em cada arremetida, a ponto de se estatelarem numa manobra mal feita, ou provocarem acidentes horríveis, como o que vitimou o piloto austríaco Niki Lauda, nos anos setenta, quando seu corpo em chamas saiu milagrosamente do carro, numa cena que ficará na memória de todos os fãs desse célebre esporte da velocidade.
Enquanto isso, um machucado Felipe Massa luta para se recuperar, com o devido apoio de sua atônita família, mediante a expectativa popular. Não deixa de ser um alívio saber que dois raios não caem no mesmo lugar, e que, felizmente, o que ocorre com Senna não se repetiu com Massa, ganhando ele pontos na vida e mais uma chance com o Papai do Céu. Apesar dos pesares, e de todas as velocidades, é sempre bom dar uma parada nos boxes, no meio da corrida, para poder pensar, que apesar das batidas e colisões do dia a dia, ainda podemos dizer, copiando o sotaque baiano, que: a vida é MASSA!
Um blog em forma de almanaque, com comentários sobre cultura, política, economia, esporte, direito, história, religião, quadrinhos, a vida do próximo, o que você desejar, ou que os seus olhos se permitam a ler e comentar, contribuindo para as reflexões desse humilde missivista, neófito nos mares internaúticos, em meio a esta paranoia moderna.
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