Foi num começo de tarde do dia 24 de setembro, que os moradores da rua Américo Guazelli, em Santo André, viram sua monotonia transformar-se em pesadelo. Uma loja de fogos de artifício pertencente a Sandro Castellani, possuía enorme quantidade de explosivos armazenados clandestinamente. Quando ocorreu a explosão, morreu instantaneamente a faxineira do loja, Ana Maria Martins, além de Denian Castellani, parente do dono do estabelecimento. O estrondo pôde ser ouvido na capital paulista, principalmente nos bairros vizinhos ao Grande ABC. As fotos e a reportagem da imprensa mostram o que era antes uma pacata rua transformada num cenário de guerra. Parecia que uma bomba ou um míssil atingiu o local.
O que mais me revoltou foram os depoimentos dos vizinhos, vítimas da explosão, que tiveram seu patrimônio destroçado, além de correr sério risco de morte. Uma senhora, ainda aos prantos, após se recuperar do choque, disse que a prefeitura sabia da existência do local, e os fiscais da prefeitura, assim como os bombeiros, recebiam propina do proprietário para permitir que a loja continuasse funcionando. Uma loja de explosivos em plena zona residencial. Quem diria!! Bom! Na periferia acontece de tudo, não é mesmo?? Pois é lá que reside o descaso do poder público.
Não se banaliza a violência apenas por existir uma polícia repressora de um Estado totalitário, onde os moradores da periferia estão sujeitos a todo de tipo de abuso, mas também o descaso e a falta de fiscalização das condições de segurança nos prédios da cidade, como tristemente aconteceu em Santo André. Os moradores entrevistados afirmaram que cansaram de telefonar para as autoridades, pedindo o fechamento da loja intrusa, por apresentar riscos a toda a comunidade. Mas não adiantou, a tragédia anunciada se concretizou quando as paredes e o teto das casas vizinhas ao local da explosão voaram pelos ares.
Desde crianças somos advertidos por nossas mães a não brincar com fogo. Conselhos que geralmente uma criança não segue, cega em sua empolgação juvenil, acabando por descobrir que o fogo queima da pior forma possível. E foi dessa forma que na Argentina, em 2004, próximo às festas de fim de ano, os moradores de Buenos Aires descobriram da pior maneira possível os males que os fogos de artíficio fazem. Naquela época, num show da festiva banda Los Callejeros, na boate República Cromagnon, no bairro de Once, alguém da platéia usou um rojão, explodindo fogos pelos ares que acabaram por atingir o teto de lona do local, provocando um incêndio dramático, que matou mais de duzentas pessoas, dentre elas parentes dos próprios membros da banda, numa das maiores tragédias urbanas da metrópole portenha. Eu presenciei o estrago dessa situação quando viagei a Buenos Aires pela primeira vez, para curtir o reveillon. Acreditem! Foi a mais triste e mais desoladora passagem de ano que já vi num lugar, numa Plaza de Mayo esvaziada, em sinal de luto e respeito pelos familiares que perderam seus entes queridos, num lugar acostumado a presenciar grandes festas populares. É! Brincar com fogos custa vidas, sendo as mais recentes aquelas ceifadas com a explosão da loja de fogos em Santo André.
Fico imaginando se a explosão ocorresse em Higienópolis, na capital paulista, morada do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ou na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Lá, os fogos de artifício são outros e os petardos são feitos de hipocrisia, arrogância e perfídia, e não de pólvora ou querosene. Assisti a uma das moradoras atingida pela explosão, visitar o que seria sua nova casa, caminhando sobre os destroços dos móveis recém-colocados na residência e agora totalmente destruídos, com as lágrimas correndo no rosto, exclamando num sincero desabafo:"não é justo!". Pois é! Não é justo a forma como o poder público local lida com comunidades de trabalhadores, não tendo o mesmo descaso com os bairros chiques da classe alta e letrada paulista. Não é justo ver que o IPTU pago todo ano à Prefeitura não é suficiente para manter mecanismos de fiscalização eficientes.
Castelanni já informou à imprensa através de um sobrinho que vai se apresentar à polícia, informando que a explosão na loja se deu por conta de um curto-circuito, no momento da instalação de um antena de TV. Ora vejam! Uma antena de TV! Que agora sintoniza em todos os canais a tragédia ocorrida pelo descaso, pela irresponsabilidade e pela vontade de ganhar dinheiro a qualquer custo. Já que cada um tem que se virar, não é mesmo? Mesmo que seja vendendo ilegalmente fogos de artíficio. Enquanto isso a vida segue, até que não se exploda tudo, de uma vez por todas, por conta da irresponsabilidade alheia. Quer um conselho: não solte fogos!!
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