Pois eis que o NHK chamou mais uma vez a atenção do público, desta vez não por uma curiosidade cultural, mas sim por divulgar as espetaculares e arrasadoras cenas do último terremoto e dos tsunamis que se abateram sobre o Japão na semana passada. Como se não bastasse ter sofrido o mais violento e pior terremoto de sua história moderna, que provocou no mar ondas gigantescas que devastaram cidades e povoados inteiros, o povo japonês ainda vive sob a iminência de uma catástrofe nuclear, devido as usinas nucleares, próximas à costa, atingidas pelos devastadores tremores de terra. Não bastou Hiroshima e Nagasaki, agora o povo da terra do sol nascente corre o risco de viver uma nova Chernobyl!
Desde criança, quando somos advertidos em sala de aula sobre a necessidade de bom comportamento e disciplina, vemos um ou outro professor (geralmente de história ou geografia) falar da dedicação e da disciplina do povo japonês, que fez com que eles reconstruíssem um império destruído na II Guerra, e se tornassem uma das nações capitalistas mais ricas do planeta. Desde os seriados de TV, com seus Nacional Kid, Ultraman, Espectroman e Jaspion, passando por Pokemon, Dragon Ball Z, mangás, animês, hentais, os poemas haikay, e os filmes de artes marciais, além do sushi e sashimi comido nos restaurantes, a cultura japonesa invadiu o imaginário pop, fazendo com que nos acostumássemos com aqueles sorridentes turistas amarelos, dos olhos puxados, sempre com uma câmera fotográfica enrolada no pescoço, e com um jeito de falar engraçado, que nos lembra da sabedoria milenar de uma terra que já foi povoada por shoguns e samurais. Havia um lema jocoso nos banheiros da USP, segundo comentários de vestibulandos da FUVEST, zombando da forte concorrência estabelecida nos cursos de engenharia pelos descendentes de japoneses, na disputa de vagas da universidade: "mate um japa e ganhe uma vaga!". Isso denota bem a crença de que o povo japonês sempre foi extremamente dedicado, aguerrido em seus propósitos, ordeiro e até certo ponto comedido, na temperança cultivada com os ensinamentos do budismo e do xintoísmo.
Pois essa mesma mansidão e disciplina agora está sendo posta à prova, diante do cataclisma que se abateu sobre o arquipélago japonês, localizado numa área repleta de falhas geológicas, entre placas tectônicas conflitantes, que já fazem dos abalos sísmicos um cotidiano de um povo habituado com tremores de terra, por séculos e séculos. Sabe-se que no Japão, a população é rotineiramente treinada para lidar com terremotos e que as construções feitas no solo japonês tem a melhor qualidade do mundo, pelo seu nível de estabilidade e segurança, capazes de suportar abalos terríveis em sua estrutura. Mas será de que desta vez os japoneses estão preparados para tamanho infortúnio? No saldo final do último terremoto de 8.9 na escala Richter (considerado de proporções apocalípticas), ainda se contabilizam mais de 3.000 mortos, sem contar os desaparecidos, e o pior ainda está por vir: uma crise de abastecimento, com falta maciça de alimentos, por conta do tsunami surgido com o terremoto, ter alagado praticamente 1/3 das terras irrigáveis no Japão. Tragédia pouca é bobagem!
Ouve-se o "sábio" dito popular de que o brasileiro é um povo abençoado, porque aqui podemos ter de tudo: enchentes, queimadas, fome, miséria, os mais corruptos políticos e a mais rasteira criminalidade; mas ao menos não temos desastres naturais que afetam outros povos, como terremotos e furacões. Mas como será que está a situação de milhares de brasileiros, muitos deles dekasseguis (descedentes de japoneses, nascidos no Brasil, que decidem voltar à terra de seus ancestrais, em busca de trabalho e melhores condições de vida)? Conheço algumas pessoas, filhos e netas de japoneses, e acredito que muitos que leem este blog também conheçam, e me pergunto o que dizer para essas pessoas quando a terra de seus familiares é abatida por um acontecimento horroroso, de tamanha proporção, e só resta a eles acompanhar de forma sofrida o noticiário. Ano passado, testemunhamos o sofrimento dos chilenos no terremoto no Chile, e depois com seus mineiros enterrados, e no trágico abalo no Haiti, vimos que a tragédia natural matou centenas, milhares de pessoas, numa proporção catastrófica, até mais do que são dizimadas populações inteiras em grandes guerras, e onde brasileiros ilustres perderam a vida, como a militante social Zilda Arns, além de muitos militares brasileiros (vide comentário sobre o terremoto no Haiti, escrito no ano passado, neste blog). Agora, pudemos apenas assistir como expectadores atônitos, com um frio na barriga, os dantescos acontecimentos no Japão, diante de cenas que beiram o pesadelo, numa situação em que podemos pensar:"puxa, isso poderia estar acontecendo aqui, comigo".
A meu ver, não resta outro caminho, diante da tragédia inevitável, do que a solidariedade. Sim, a boa e velha palavra bonita e manjada chamada solidariedade. Alguns mais caústicos, de humor ácido ou que simplesmente manifestam sua revolta, podem dizer que é falta do que fazer escrever sobre as vítimas do terremoto no Japão, mas, como cristão e humanista (lá vem as minhas autorotulações!), eu sempre chamo atenção para uma postura minimamente sensível, que podemos ter diante de tragédias como essa, que abatem o povo japonês; pois o sofrimento não é um sentimento exclusivo e próprio, exibido egoísticamente como unicamente nosso, com direito a exibir uma nota de compra ou um título de propriedade, dizendo que nós é que temos que chorar os nossos mortos, e os outros que se danem. É verdade que temos as nossas vítimas das enchentes, enxurradas e desabamentos aqui para chorar, mas sempre temos também um sentimento universal que nos diferencia enquanto gênero humano: a capacidade de se compadecer e compartilhar a dor da outro.
Acredito que os blogs, como qualquer outro meio de comunicação, também tem o seu papel social, e, diante disso, junto-me ao movimento de solidariedade e apoio às vítimas do terremoto e dos tsunami no Japão, enviando aqui alguns endereços e e-mails, sob respaldo da Aliança Cultural Brasil-Japão, a Beneficência Nipo-Brasileira de São Paulo, a Federação das Associações de Províncias do Japão no Brasil, além de muitas outras organizações, fornecendo conta bancária e contatos, para aqueles que se interessarem em contribuir com as vítimas da catástrofe japonesa, a partir dos seguintes dados:
e-mail: contato@bunkyo.org.br e telefone (11)3208-1755, assim como no endereço eletrônico info@kenren.org.br e nos números (11)3277-8569, (11)3277-6108 e (11)3399-4416. Também é possível obter informações pelo e-mail: enkyodiretoria@enkyo.org.br e os telefones (11) 3274-6482, (11) 3274-6484, (11) 3274-6489 e (11) 3274-6507.
Bradesco - agência: 0131-7, contas-correntes 112959-7 e 131.000-3; Santander, agência: 4551, conta-corrente:130900004-4; Banco do Brasil, agência: 1196-7, conta-corrente 29921-9
Naturalmente, quem se interessar, ligue e confirme os dados, a fim de dar essa grande e importante contribuição para o povo japonês. Como fazem os budistas em suas meditações, proferindo as palavras rituais que atraem energias positivas e harmonia diante do sofrimento, entôo o daymoko: Nam-Myoho-Rengue-Kyo . Boa sorte, Japão!
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