Em 1950, no fatídico dia 16 de julho, no Rio de Janeiro, a seleção do Uruguai, liderada por seu capitão, Obdúlio Valera, ganhava a final da Copa do Mundo, no estádio do Maracanã, derrotando o anfitrião, Brasil, por 2 X 1, num episódio que ficou conhecido na história do futebol e na crônica esportiva uruguaia como maracanazo (ou "maracanaço" em bom português). Sobrou, durante anos, a culpa pela derrota para o injustiçado goleiro brasileiro, Barbosa, e no gramado silencioso ao final do jogo, de uma torcida brasileira emudecida nas arquibandas lotadas, restou a glória uruguaia e a cena que entraria para a posteridade, do craque uruguaio Máspoli, consolando o derrotado e em prantos jogador brasileiro, Augusto, ao final do jogo. Diz a lenda que foi um vitorioso Varela a comemorar solitário pelos bares da Lapa na noite carioca, a vitória uruguaia e a consequente derrota brasileira que, no orgulho nacional ferido, jamais deveria ter acontecido. Naquela época, ao menos naquele período, a festa no solo brasileiro era uruguaia!
Voltando o relógio do tempo para os dias atuais, Buenos Aires esteve em festa no último domingo, mais uma vez com a celebração de uma vitória futebolística, com o tradicional monumento do Obelisco, na avenida Nueve de Julio ocupado por.........uruguaios??? É que desta vez coube aos torcedores da nação vizinha a comemoração do campeão de 2011 da Copa América, que ao invés de ser sempre os favoritos Brasil ou Argentina, agora cederam o cetro para o Uruguai. Mais uma vez, o Uruguai comemorava uma vitória futebolística no terreno do adversário e vizinho. Coube aos dois países que fazem fronteira com a república gaucha o cenário para a comemoração de um dos países sul-americanos com mais tradição no futebol.
Tradição que sempre foi a marca do futebol uruguaio, apesar dos mal resultados nos últimos anos e um imenso jejum de décadas sem conseguir chegar às fases finais de um torneio mundial, como foi na última Copa do Mundo, e um período de imenso ostracismo da região no futebol internacional, apesar de dois títulos mundiais. Com o passar do tempo, mais precisamente nos últimos cinco anos, o futebol uruguaio passa por um processo de renovação, com o surgimento de novos craques, a consolidação de seus clubes esportivos em torneios internacionais (o vice-campeonato do Peñarol na última Taça Libertadores da América é exemplo cabal disso), a exportação de bons jogadores para clubes europeus e a recuperação da glória nacional, com a multidão de milhares de uruguaios concentrados em Montevideo ou nos países vizinhos, comemorando os feitos da equipe de seu país-natal, num país com menos habitantes que o estado da Paraíba.
A seleção de futebol do Uruguai, é bem verdade, não chega com ineditismo com a vítória do campeonato na Copa América, mas de fato e de direito se consagra como o maior campeão da história das Américas, com seu 15º título conquistado na partida final de domingo, dia 24 de julho. Contra um inexpressivo e inesperado Paraguai, a seleção de Lugano, Fórlan, Loco Abreu e Suarez, ergueu orgulhosa a taça de campeão, ao final dos 90 minutos de jogo, após uma bela e antológica vitória de 3 X 0 contra o adversário. Ao adversário Paraguai restou a comemoração de um vice-campeonato obtido quase por acidente, pois foi a única equipe a chegar à final do torneio sem ter ganho um jogo sequer. Com a derrota para o Uruguai na final, parece que a seleção paraguaia ficou no seu merecido lugar, fazendo com o que o país ficasse mais conhecido no torneio não pela qualidade dos seus jogadores, mas sim pelo que se viu nas arquibancandas, na beleza das curvas e nos seios siliconados da torcedora fanática e modelo paraguaia, Larissa Riquelme. Felizmente, no final da Copa América venceu o bom futebol e venceram, merecidamente, os uruguaios. Os deuses do futebol sorriram novamente!
O Uruguai ganhou porque demonstrou garra, teve espírito de equipe e valorizou o título obtido com a competição, num sentimento que somente rivalizou com a Argentina, país-sede do campeonato este ano, mas que nem de longe acometeu a seleção brasileira, liderada pelo técnico Mano Menezes. Ao contrário da apatia brasileira na humilhante disputa de pênaltis, nas quartas de final, que resultou na vitória do Paraguai e a consequente eliminação precoce do Brasil no torneio, a seleção do Uruguai não apenas valorizou a vitória na cobrança das penalidades máximas com a Argentina, como também levou seu espírito de equipe para o campo, nas duas partidas seguintes, na semifinal e na final, carimbando o título de forma merecida, numa fase histórica que demonstra o ressurgimento do Uruguai, bicampeão mundial, como um dos gigantes do futebol internacional, através de um respeitável quarto lugar na última Copa do Mundo da África do Sul. Até o momento, em termos de continente, é o Uruguai que chega mais longe nas competições internacionais, na frente dos tradicionais favoritos, Brasil e Argentina, mostrando que la mano de Diós também é uruguaia.
Foi bonito ver o Uruguai jogando nesta Copa América, como foram bonitos os gols da partida final, feitos pelo artilheiro da competição, Suarez, e os gols seguintes feitos por Fórlan, maior goleador da história recente da seleção uruguaia, um dos melhores do mundo e considerado o melhor jogador da Copa passada. Fórlan desencantou depois de uma série de partidas sem fazer gol pela seleção uruguaia, sendo responsável na final da Copa América pelos dois últimos gols da bela goleada feita pela Celeste contra a seleção do Paraguai. Para os amantes do futebol, como eu, só posso dizer: Vila el equipo del Uruguay!!!
Em relação ao futebol brasileiro, fica a lição e o respeito pela conquista uruguaia. Irrito-me com as opiniões arrogantes e o argumento derrotista carregado de oportunismo de alguns defensores do atual técnico brasileiro, dizendo que para um país pentacampeão do mundo como o Brasil, a conquista de uma Copa América é uma vitória de menos, pois corresponde a um título menos expressivo. Ledo engano! Hoje em dia, com a globalização e a mundialização do esporte, com centenas de telas de TV, celulares e computadores acessando pela internet torneios futebolísticos internacionais com mesmo grau de interesse e quantidade de anunciantes, competições como a Eurocopa e a Copa América, rivalizam com torneios globais como o Mundial Interclubes, a Copa das Confederações, o campeonato da Europa e a própria Copa do Mundo. Hoje em dia, é comum encontrar em diversos países e continentes, jovens das mais diversas nacionalidades ostentando camisetas do Barcelona, do Real Madri ou do Manchester United, com tanto orgulho ou fanatismo quanto torcedores flamenguistas, corintianos ou botafoguenses. Desta forma, cada torneio tem sua grau de importância equivalente, não cabendo a palpiteiros oportunistas considerar que por conta de uma vergonhosa e desastrosa derrota nos pênaltis para o Paraguai, poderá manchar a credibilidade de uma seleção "vitoriosa" como a brasileira. Ah! Tá!
Só sei que o peso da arrogância já comprometeu outras seleções, de outros países, que amarelaram feio e deram vexames históricos, como as derrotas respectivas, na primeira fase da última Copa, de equipes como as da França e da Itália. Certamente, por toda sua história, compromisso com a formação de craques e a dimensão cultural que o futebol tem no país, como modalidade esportiva mais praticada, faz do Brasil um fortíssimo candidato ao título no próximo Mundial, com a responsabilidade de fazer bonito na competição de 2014, onde, mais uma vez é anfitrião. Novos e maravilhosos craques, como Neymar, são emblemáticos exemplos de como o sangue novo poderá ser crucial para o êxito da seleção brasileira e a conquista do hexacampeonato mundial. Entretanto, se continuarmos a nos pavonear em nosso preconceito regional, e considerar como sendo títulos menores os conquistados pela atual seleção uruguaia, correremos o risco de experimentar amargamente mais um maracanazo. Portanto, te cuida Mano Menezes!!
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