A disputa das premiações do Oscar este ano promete ser uma das mais emocionantes e acirradas da história. Tudo porque, tirando o prêmio de melhor atriz coadjuvante para Anne Hattaway (por sua atuação perfeita no musical "Os Miseráveis"), nas demais categorias não existem favoritos e tudo pode acontecer no Dolby Theater, em Los Angeles, hoje, no dia 24 de fevereiro.
Agora, imagine uma bela e talentosa atriz, jovem mas madura, aos seus 35 anos, que já contracenou com os maiores astros do cinema e foi dirigida por cineastas que muitos atores disputam aos tapas, e, além disso, ruiva. O nome dela é Jessica Chastain (o sobrenome é artístico, pois o de batismo é Howard). Jessica concorre ao Oscar de melhor atriz juntamente com adversárias igualmente talentosas, como Jennifer Lawrence ("O Lado Bom da Vida"), Naomi Watts ("O Impossível"), Quvenzhané Wallis ("Indomável sonhadora") e Emanuelle Riva ("O Amor"). No confronto direto, eu diria que a adversária que pode tirar o prêmio de Chastain é Jennifer Lawrence, cuja atuação em "O Lado Bom da Vida" eu já comentei no post anterior. Por outro lado, Wallis e Riva competem dentro de uma curiosidade histórica: são, respectivamente, a mais jovem e a mais velha atriz a concorrer ao prêmio máximo da Academia, na 85º Edição do Oscar.
Eu tive acesso à atuação e talento de Jessica Chastain pela primeira vez ao vê-la no filme "A Árvore da Vida", de Terence Malick. Contracenando com Brad Pitt, como a esposa dona de casa e mãe de família tipicamente norte-americana, nos anos sessenta, Jessica me comoveu com uma atuação primorosa e intimista, que nos fez sentir todo o afago e amor materno. Na época ela já tinha recebido excelentes comentários, tornando-se uma espécie de "queridinha da crítica" por conta de suas escolhas e interpretações. Na verdade, com os decorrer dos filmes que atuou, ela demonstrou ser uma atriz dedicada e minimalista na escolha de seus papéis, dando um toque especial a todos os seus personagens, como a esposa do general Coriolano, ao lado do ator Ralph Phiennes, incorporando Shakespeare no cinema; ou representando o elegante e sensual interesse amoroso do ator Tom Hardy, no filme de gangsters "Os Infratores". Vale destaque para sua atuação também em "Histórias Cruzadas"( que deu o Oscar de melhor atriz coadjuvante para Octavia Spencer), quando interpretou uma peseudofútil mulher de milionário, odiada por outras mulheres, na Mississipi racista e provinciana do século passado.
Agora, o grande momento de Jessica Chastain, sem dúvida, foi com sua indicação ao Oscar por interpretar uma agente da CIA, no novo filme de Kathryn Bigelow (a mesma que dirigiu e ganhou o Oscar de melhor direção por "Guerra ao Terror"), o thriller político "A Hora mais Escura". No filme, Jessica é Maya, uma agente novata que, ao ingressar no serviço secreto após o terrível atentado terrorista das Torres Gêmeas, no 11 de setembro (que ceifou milhares de vidas, como todos sabem), dedica dez anos de sua vida a pegar o terrorista Osama Bin Laden. O filme parece uma continuação de "Guerra ao Terror", com seu tom de quase documentário, e com uma protagonista mulher no lugar de um homem, mas se a diretora Bigelow conseguiu transformar o ator Jeremy Renner em um astro, no filme anterior, aqui ela trabalhou com uma atriz completa. O filme é totalmente feito para ser conduzido por uma protagonista feminina, e Jessica Chastain consegue dar conta da responsabilidade, nas duas horas de uma película em que o espectador acompanha as buscas, fracassos, tentativas, erros e estratégias montadas pela personagem, até conseguir seu objetivo maior que é matar o terrorista saudita que assombrou o inconsciente coletivo norte-americano, durante toda a primeira década do nosso século.
O filme era para ter um nome diferente, pois se tratava apenas da caçada a Osama Bin Laden, sem ter um final definitivo, até que Bigelow foi surpreendida pela notícia da morte de Bin Laden, alvejado por forças especiais norte-americanas em Abbotabad, no Paquistão, em uma operação secreta autorizada pelo governo Obama, num episódio já conhecido historicamente por todos. A diretora recria a operação, em sua riqueza de detalhes, contando como uma mulher esteve na supervisão disso o tempo inteiro, mostrando em cenas dramáticas e de tirar o fôlego, o suspense dos soldados ao entrar de helicóptero no meio da noite, na fortaleza onde estaria escondido um dos homens mais perigosos do mundo. Fiel à narrativa oficial, o grande mérito do filme é mostrar as últimas horas de Bin Laden, do ponto de vista de quem o matou, além de mostrar a gama de sentimentos que permeava o coração de todos os funcionários da CIA, depois de anos de fracassos na tentativa de localizar e matar o terrorista. É justamente nesse processo de acerto de contas com o passado recente da história americana, que a personagem de Jessica Chastain brilha no filme.
Sua atuação mereceu destaque e indicação ao Oscar, por mostrar a metamorfose de Maya no momento em que ela ingressa de cabeça na missão de destruir Bin Laden. De uma novata relutante, que se assusta com o grau de violência, no emprego da tortura de supostos membros da Al Qaeda, numa prisão em Guantánamo e numa base no Iraque, surge uma agente experimentada, firme mas sem cair no clichê, que dá uma lição de moral num figurão da CIA, num dos grandes momentos do filme, quando ela começa a encontrar obstáculos colocados pelo próprio governo, para encontrar o autor dos atentados das Torres Gêmeas. Destaque especial para uma reunião com o Secretário de Defesa norte-americano, quando é apresentado o plano para localizar Bin Laden e o secretário pergunta quem fez o plano. "Eu fui o filho da puta que fiz esse plano", responde a inquieta agente, prenunciando o climax do filme, que está para acontecer. O grande mérito da atuação de Chastain é o de mostrar o desgaste e a ruptura emocional de alguém que acaba transformando uma missão oficial numa cruzada, em que desejos de vingança e sentimentos de cumprimento do dever misturam-se, a ponto de quebrar a sanidade de quem não esteja preparado. Não é o que acontece com Maya, que, apesar de toda a pressão e das cobranças em não conseguir localizar o terrorista durante anos, não se deixa desabar, ao menos até completar sua missão final, e dar satisfação muito mais a si própria do que a seus superiores, de que o êxito é possível numa tarefa tão complicada e perigosa.
Na noite de hoje as apostas estão lançadas e Jessica Chastain pode sair da cerimônia do Oscar premiada ou não. De qualquer forma, somente o fato de ter recebido uma indicação já lhe dá cacife para ser considerada uma grandes atrizes em atividade, na indústria do cinema atual. O fato de ser ruiva é apenas um plus que realça de charme uma artista que consegue se tornar visível não apenas pela beleza, mas pela imponência na atuação. Que venham novos papéis, novas heróinas e novos personagens, para uma tão talentosa e equilibrada Jessica Chastain. Nós, os fanáticos por cinema, agradecemos muito!