terça-feira, 21 de maio de 2013

REST IN PEACE: Morreu Ray Manzarek, eterno tecladista do The Doors

O tecladista Ray Manzarek na juventude.
Em 1991 estreava nos cinemas o filme The Doors, baseado na história da banda de rock homônima, com o ator Val Kilmer interpretando o protagonista, o cantor Jim Morrison, morto em 1971, ano em que nasci. Morrison era o frontman dos Doors, grupo musical que se encerrou logo após sua morte aos 27 anos, por uma até hoje mal explicada overdose de drogas em sua banheira, num hotel em Paris. Quando o filme saiu, eu tinha acabado de ler a biografia da banda e conhecer o trabalho deles. Recordo que eu estava voltando de um Congresso da UNE em São Paulo, chegando em casa de viagem, quando encontrei minha mãe triste, chorosa, na sala, acompanhada de parentes, e soube naquele dia que tinha morrido minha avó, vítima de um atropelamento. Lembro que pela noite, naquele clima lúgubre da perda de um parente e sozinho com meu aparelho de som no quarto e um fone de ouvido, deu vontade de escutar uma música do The Doors, a canção Riders on the Storm, com o barulho de chuva introdutório, o som dos teclados e a voz inconfundível de Jim Morrison. Além da voz do cantor, também foi ali que eu aprendi a curtir o teclado de Ray Manzarek.

Sem dúvida, Jim Morrison encarnava a banda, é seu principal símbolo até hoje, e sua voz (além de uma performance arrebatadora nos palcos) ficou para a história da música. Assim como o Legião Urbana no Brasil, a história de uma banda de rock é indissoluvelmente ligada ao seu vocalista. Entretanto, se Morrison era o coração da banda, Ray Manzarek, fundador e tecladista do grupo era seu cérebro, o motor motivador de toda a sonoridade que galgou os Doors e Morisson ao estrelato. Manzarek fez com que seu colega de banda, até então um tímido estudante de cinema e aspirante a poeta, fã de Rimbaud, pudesse se tornar um dos maiores vocalistas da história do rock. No filme do diretor Oliver Stone ele é retratado com economia de detalhes pelo bom ator Kyle Maclachlan (da lendária série de TV, Twin Peaks), mas o retrato de Manzarek no cinema é muito pequeno em relação seu legado, e talvez uma das melhores biografias de bandas de rock seja o clássico livro Daqui ninguém sai vivo, dos jornalistas Jerry Hopkins e Danny Sugerman. Lá é possível encontrar a real dimensão de cada integrante dos Doors, e entender melhor o talento e a personalidade de Ray Manzarek.

Nos teclados ele era o cara.
Manzarek morreu ontem, dia 20 de maio de 2013, aos 74 anos, vítima de um câncer, em um hospital em Rosenheim, Alemanha, acompanhado da esposa e dos dois irmãos. Eu tive a (grata) oportunidade de vê-lo tocando em 2002, quando eu morava em São Paulo, numa apresentação do The Doors of 21 Century, tendo o vocalista do The Cult, Ian Ashbury, brincando de clone de Jim Morrison, fazendo uma animada apresentação no Credicard Hall. Lá, eu vi Manzarek, já idoso, acompanhado de seu também envelhecido colega remanescente do The Doors original: o guitarrista Robby Krieger (o baterista John Densmore foi contra a reunião).  Apesar da ausência de Densmore, foi um episódio memorável e que merecia as fotos que eu não tirei, mas fica aqui o registro de um show muito bacana, feito para saudosistas e para as novas gerações que queriam escutar, ao vivo, um som que se difundiu com o filme do Oliver Stone há dez anos, mas que há trinta anos, já naquela época, soava como antológico. Ray Manzarek era o real líder da banda e demonstrou isso durante toda a apresentação do grupo, mostrando competência nos teclados, assim como mostrou talento ao interagir repetidamente com o público, mais do que o vocalista, fazendo piadas sobre uma suposta farra de velhos hippies numa Amazônia lisérgica, rodeados de drogas alucinógenas, florestas e belas índias. A turnê daquela época já revelava que, sem depender das entrevistas para justificar o retorno dos integrantes originais do The Doors, o objetivo de tocar junto com seus velhos companheiros dos anos sessenta era menos do que ganhar dinheiro e mais de se divertir, para um rockeiro de terceira idade. A imprensa já havia revelado, antes da turnê, que o grupo saía em público com o nome requentado (utilizando a expressão 21 Century ao final do logo original da banda, devido a um processo na Justiça movido pela família de Jim Morrison). Os familiares do falecido Morrison queriam, na verdade, abocanhar toda a grana da turnê dos caras e conseguiram, o que dava mais uma cara de aventura a peripércia daqueles músicos veteranos vir à América do Sul, fazer uma turnê que ia dar zero de lucro. Mas foi o que Manzarek e sua turma fizeram.

Com o The Doors, na época da formação clássica do grupo.
Raymond Daniel Manzarek Jr. nasceu em Chicago, no dia 12 de fevereiro de 1939. Um virtuose no piano na infância (apesar de preferir o basquete quando jovem, diz sua biografia), ele foi um dos maiores tecladistas da história do rock, junto com  Jerry Lee Lewis e John Lord, do Deep Purple (este também falecido este ano). É dele o riff inicial e inesquecível da canção Light my Fire, um dos grandes sucessos do The Doors e música tocada até hoje nas rádios, como uma das mais reproduzidas do século XX, assim como de singles famosos dos Doors como The End e People are Strange. Além dos Doors que o tornou célebre, seu talento pode ser encontrado em diversos álbuns solo, participações com outros músicos ou projetos artísticos alternativos desenvolvidos na música popular moderna, nos últimos quarenta anos. Ele já trabalhou com rockeiros como Iggy Pop, músicos experimentalistas como Philip Glass e com bandas clássicas inglesas dos anos oitenta, como o Echo and The Bunnymen. Casado com a mesma mulher, de ascendência japonesa (Dorothy Fujikawa), desde 1967, no The Doors Manzarek compartilhava as personas de maluco beleza, músico virtuose e homem de negócios. Ele sempre foi antenado com o som de seu tempo, e nunca dispensava uma parceria com músicos mais jovens. Não é à toa que pelo twitter, foi comum ver uma centena de músicos e celebridades postarem mensagens de luto, externando seu lamento pela perda de um músico tão extraordinário.

Rendo aqui a minha homenagem a Ray Manzarek, como a tantos outros que fizeram a minha cabeça com seu talento e deixaram como legado para meus ouvidos músicas inesquecíveis. Desejo que descanse em paz, Ray! E desejo todo o consolo do mundo a sua família. É bom salientar que o tecladista falecido deixa esposa, um filho e três netos, que tem agora a missão de honrar sua memória, divulgando sua música. Em tributo ao The Doors, de Jim Morrison e de Ray Manzarek, deixo aqui o vídeo de People are Strange, uma das músicas que mais gosto do grupo,  num tributo ao grupo realizado recentemente pelo cantor Marilyn Manson, contando com a participação de Robby Krieger e uma das últimas aparições de Manzarek, nos palcos, em 2012 :


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