quarta-feira, 26 de maio de 2010

MÚSICA/HOMENAGEM: Morre Dio, vira-se uma página do Heavy Metal.

O heavy-metal está de luto!! Morreu o "baixinho invocado" do rock pesado. Sou um cara com gosto eclético pra música. Vou desde um Chico Buarque, Noel, Cartola e Jorge Ben Jor, passando por um tropicalismo de Caetano, Gal e Gil, uma bossa-nova de Jobim e Nara Leão, um rock'n roll a la Chuck Berry, Elvis, além dos clássicos Beatles e Rolling Stones, Led Zepellin ou The Who, até chegar a um blues e um jazz de Miles Davis ou Charles Mingus, sem esquecer música clássica de Brahms ou Bach,  e música eletrônica. Só não aguento axé, pagode e nem os discos de Frank Aguiar, Calcinha Preta ou Osvaldo Montenegro e nem o Bonde do Tigrão. Entretanto, sou de origem eminentemente rocker, como maciçamente foi minha geração, mas sou assumidamente fã de metal. Não obstante não me considerar parte de uma tribo urbana, confesso que minha formação musical na adolescência passou muito por escutar discos do Judas Priest, do Manowar, do Iron Maiden, AC/DC, Saxon, Metallica e, principalmente, da banda ícone de toda uma época: o Black Sabbath.

Foi no Sabbath que despontou para o sucesso Ronnie James Dio (1942-2010), na formação vice-campeã do grupo, após Ozzy Osbourne ter saído da banda, no final dos anos 70. Na década de 80, Dio figurou no Sabbath por apenas três discos(Mob Rules, Heaven and Hell e Live Evil), mas deixou na história do rock sua marca inconfundível: timbres agudos e viscerais, perfomances vigorosas, uma teatralidade mórbida e um domínio de palco raro, para muitos frontmen. Dio era sobretudo um cantor carismático, e devido a esse carisma atribuí-se a ele um dos gestos mais conhecidos entre os fãs de heavy-metal e que se notabilizou como o sinal dos metaleiros de todo o mundo: as mãos erguidas com o dedo minimo e o indicador levantados, formando com o polegar uma forma que simboliza chifres, como que representando um animal satânico. No documentário Metal, dirigido pelo antropólogo norte-americano Sam Dunn, ao ser entrevistado, Dio, de origem católica, atribuíu o gesto a uma avó que ele tinha, imigrante italiana, que a tudo que via fazia o gesto característico do chifrinho, como que para espantar mau olhado; ou seja, Dio refutou as acusações prosaicas de que estivesse incentivando o satanismo para jovens e incautas multidões de adolescentes que escutavam sua música, pois acabou demonstrando que estava fazendo apenas uma brincadeira que se tornou uma referência pop. Foi num show do Sabbath que Dio repetiu o gesto, e assim, até hoje, milhões de metaleiros em todo o mundo reproduzem o sinal dos chifres, como que num ritual em homenagem a um dos sons mais controvertidos e tocados no planeta.

Eis que na manhã do último dia 16 de maio, a comunidade headbanger amanheceu num triste domingo de luto, ao saber que o ex-vocalista de bandas como Rainbow e Sabbath havia sucumbido, não resistindo a sua luta de mais de dois anos contra um câncer de estômago. Dio talvez tenha sido uma das primeiras celebridades do rock pesado a não morrer de overdose de drogas, AIDS ou tiros, e sim falecer da forma como padecem a maior parte dos outros mortais: Dio morreu de velhice! Foi de uma doença associada à velhice que o velho vocalista satânico bateu as botas, e não queimado em chamas por um raio divino, como muitos apressados religiosos fundamentalistas norte-americanos quiseram que ele morresse, nas campanhas moralistas da década de 80 contra o rock'n roll.

Ronald James Padavona (nome de batismo) nasceu em 10 de julho de 1942, em Portsmouth, estado da Virginia, nos Estados Unidos, filho de imigrantes de origem italiana. Na juventude, segundo seus biógrafos, o jovem Ronnie participava de bandas adolescentes de folk e rock no colégio, na década de sessenta, adotando o sobrenome Dio em homenagem a um famoso mafioso italiano preso na época, até se unir a colegas de sala de aula formando a banda Vegas King, que depois se chamaria Elf (primeira incursão comercial do músico com uma banda de rock), cantando por três discos nesta banda, até conhecer, na década de 70, o guitarrista Ritchie Blackmore, já famoso por sua participação na antológica banda Deep Purple, que havia saído do grupo e formado uma banda própria, chamada Rainbow. Blackmore chamou Dio para assumir os vocais do Rainbow, e assim ele ingressou no mundo do rock pesado, com seu timbre de voz característico de tenor, chamando a atenção pelos vocais inflamados e cheios de emoção, trabalhando em quatro álbuns do grupo de Blackmore. Em 1979, quando Ozzy Osbourne saía de um consagrado Black Sabbath, após as gravações do álbum Never Say Die, deixando um vácuo difícil de ser transposto, Dio foi convidado pelo líder da banda e guitarrista Tony Iommi, a assumir o lugar de Ozzy. Ciente da responsabilidade de substituir um cantor já consagrado pela fama, Dio não fez feio, e, ao contrário, desde os primeiros acordes em que começou a cantar com o pessoal do Sabbath, disse a que veio.

No Black Sabbath, Dio inaugurou uma nova fase do grupo nos primeiros anos da década de 80. Foi nessa época, na minha adolescência, morando em Brasília, que comecei a colecionar discos de rock e ouvir bandas de rock pesado. Foi nesse período que conheci o som do Black Sabbath (na formação com Dio), já que Ozzy Osbourne eu conhecia pelos álbuns solo, antes de escutá-lo nos discos da década anterior, cantando no Sabbath. Os três álbuns antológicos do Black Sabbath que Dio participou ficaram permanentemente na história do rock, nos meus ouvidos e na minha memória. Até hoje, a canção-título do primeiro álbum com Dio, Heaven and Hell, é um verdadeiro hino, com a voz lírica de Dio, acompanhando o dedilhado feroz da guitarria de Iommi. Os primeiros versos são de uma grandeza apocalíptica:

"Sing me a song, you're a singer



Do me a wrong, you're a bringer of evil


The devil is never a maker


The less that you give, you're a taker


So it's on and on and on, it's heaven and hell."

E assim Dio cravou sua passagem na história do rock. Parecia que o Black Sabbath tinha reencontrado seu rumo, com um vocalista tão ou mais carismático que o próprio Osbourne. Ocorre que no meio da década, por brigas de egos, disputas nas vendagens dos discos ou mesmo por pura babaquice, Dio e Iommi brigaram, sendo o cúmulo da separação do grupo, o prosaico episódio em que um enfurecido Dio saiu do estúdio, no meio das gravações da banda, quando, segundo ele, propositadamente diminuíram o volume de seu microfone, enquanto as guitarras bombavam no estúdio, sufocando sua voz. Dio passou a ser conhecido como um músico perfeccionista, exibido, arrogante, vaidoso e até mesmo chato, mas o que se sabe a partir de então é que ele resolveu fazer carreira própria, passando a lançar discos solo numa banda com o seu próprio nome. Nascia a marca Dio.

E como marca, pelos anos seguintes, parece que Ronnie James Dio soube conduzir bem sua carreira solo, empresariado pela esposa Wendy, e contando com bons músicos na formação das bandas de apoio que o acompanharam. Para mim, seu disco mais clássico e mais conhecido pelos fãs é o ótimo Holy diver, o disco cuja capa marcou então o símbolo da logomarca do nome da banda, além do desenho de um diabo fashion, totalmente estilizado, com sua música mais famosa, que tocava nas FMs da época, a marcante Rainbow in the Dark. A partir de então Dio fez carreira com seus discos, shows animadíssimos, uma legião crescente de fãs adolescentes e antigos devotos do Sabbath e apreciadores de heavy-metal, participando de trilha sonora de filmes, vendendo camisetas, posters e um todo um merchandising associado a sua música e sua imagem. Dio cantou com outros músicos de metal no célebre disco Hear'n aid, na canção Stars, em 1986, como parte de uma contribuição da comunidade heavy metal nas campanhas de combate à fome na África, reproduzindo iniciativas como o Live Aid, na Europa, ou o We are the one, nos EUA, patrocinado por Michael Jackson e outros músicos pop.

Uma das últimas vezes em que vi Dio com vida, além de sua participação no documentário sobre metal de Sam Dunn, foi na comédia de Jack Black, com seu grupo musical Tenacious D, em que ele interpreta a si mesmo como uma espécie de "conselheiro espiritual" do personagem de Black. Mas o canto do cisne do ex-vocalista do Sabbath se deu mesmo na turnê da banda Heaven and Hell, em 2007, uma homenagem dos ex-integrantes do Sabbath, com os velhos Tony Iommi na guitarra, Geezer Butler no baixo e Vinnie Apice na bateria, tocando sucessos dos discos da banda cantados por Dio. A turnê veio ao Brasil em 2008, e o público brasileiro teve o gostinho de ver Dio cantar pela última vez, além do registro dos shows em CD e DVD. A banda ainda lançaria em 2009 o álbum The Devil you know, com músicas inéditas. Foi o canto do cisne de um cantor que anunciou no final deste mesmo ano que estava com câncer, anunciando aos seus fãs sua retirada dos palcos para a retirada do tumor. Dio esperava voltar a cantar em breve, assim que passasse, no começo deste ano, por uma quimioterapia e radioterapia severas. Infelizmente, não foi assim que, para quem acredita, Deus quis. Dio faleceu agora, em maio.

Resta agora o legado do velho músico aos seus fãs, além de uma fundação, criada por iniciativa dele, com investimentos de sua fortuna pessoal, para estabelecer um instituto de pesquisa e combate ao câncer.Dio se foi, mas suas canções permanecem vivas, suas perfomances de palco ficarão para sempre na memória e serão reproduzidas exaustivamente no youtube, e, sobretudo, as novas gerações ainda terão muito a escutar e aprender, ouvindo as músicas do Black Sabbath, ou os álbuns solo de um músico que viveu intensamente sua época, e que cantou o espírito do heavy metal, através de seu talento e rebeldia: AND IT'S ON AND ON AND ON. IT'S HEAVEN AND HELL. Goodbye, Dio!!

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