O povo judeu é um povo sofrido, disso até uma criança de cinco anos hoje sabe. Foram vítimas de um holocausto no século XX, foram perseguidos a mais de mil no começo daquele século, sofreram ( e ainda sofrem) todo tipo de preconceito, são muitas vezes mal compreendidos em seus costumes e até hoje recebem a pecha de muitos de terem assassinado Cristo (Mel Gibson, com seu filme sobre a Paixão de Cristo só fez reacender isso).
Mas, afinal, qual é o problema do povo judaico; ou melhor, qual o problema de Israel, em dizimar o povo vizinho palestino, lançando mísseis à cata de terroristas em Gaza, manchando a região de sangue, a pretexto de combater a guerra ao terror? Qual o problema de deixar barcos trazerem carregamentos de comida, rompendo um bloqueio perverso, contra um povo miserável, que acoberta terroristas, assim como famílias faveladas acolhem traficantes em suas casas, pela falta total de apoio do Estado, e por conta de seus algozes, que promovem uma ocupação irracional? Por que todos que criticam as ações do governo de Israel e se opõem podem ser vítimas de balas de fuzil, metralhadora, mísseis ou bombas? Vão me dizer que a questão Israel-Palestina é complexa. Sim, concordo, muito complexa! Não se trata apenas de ingressar no maniqueísmo de dizer quem tem razão e quem não tem, quem são os bandidos terroristas e os mocinhos soldados defendendo a pátria dos escolhidos. Mas a discussão não é essa. O povo de Israel sofre com uma situação que já perdura mais de cinquenta anos, desde a fundação do Estado Judeu, e não é de agora que vários, mas muitos estudiosos, debruçam-se sobre o confilto envolvendo árabes e judeus, israelenses e palestinos.
Lembro-me de um episódio em Porto Alegre em que estava num agradável café, na Cidade Baixa, e uma de minhas interlocutoras era uma psicóloga de origem judaica que tinha ido a Israel. A moça (muito bonita e educada, por sinal), além de psicóloga, era frequentadora da sinagoga, e tinha visitado Israel ao menos umas três vezes. Disse-me ela que era sionista de carteirinha, e, pra quem não sabe, o sionismo é a forma mais emblemática de manifestação do nacionalismo judaico (foi no Manifesto dos Sábios do Sião, escrito no século XIX, que se defendeu, pela primeira vez, as bases de um Estado Judaico). O sionismo se vale de uma mescla de argumentos religiosos, históricos e geopolíticos para justificar a necessidade de um Estado Judeu no mundo, e para isso, defendem, inclusive, a luta armada, pois entendem que tal Estado deve ser obtido de qualquer forma para o "povo eleito de Moisés", pois o martírio faz parte da lógica dos que lutam e morrem pela fé (alguém já viu algo parecido no islamismo?).
Não adiantava, naquele momento, contrariar a empolgada moça e questionar a matança de milhares de civis nos últimos anos, pela ação truculenta do exército israelense;a intrepidez à beira da irresponsabilidade de seu serviço secreto, matando líderes de organizações terroristas em hotéis, com requintes de bandidagem; ou cometer o absurdo de metralhar navios de ajuda humanítária que trazem comida e remédios para a população sofrida de Gaza. Um sionista, defensor incondicional da causa de Israel, é pior que um colorado ou gremista na defesa de seu time, e mesmo que ele erre, o erro é muitas vezes atribuído a uma provocação do adversário, e não a um erro genuíno de quem erra. Nesse "gre-nal sionista", sobra pros palestinos. Se todos os que atacam Israel são seus inimigos, então, para os inimigos, segundo a Torá, bala neles!!! Quer dizer, que o Anjo Exterminador baixe sua espada vingadora, e que o "povo eleito" se mantenha de prontidão e abata os inimigos de Israel. Fico imaginando a interpretação da seguinte passagem do livro biblico de Ezequiel:
"Prepara-te, e dispõe-te, tu e todas as multidões do teu povo que se reuniram a ti, e serve-lhes tu de guarda. Depois de muitos dias serás visitado. No fim dos anos virás à terra que se recuperou da espada, e que foi congregada dentre muitos povos, junto aos montes de Israel, que sempre se faziam desertos; mas aquela terra foi tirada dentre as nações, e todas elas habitarão seguramente. Então subirás, virás como uma tempestade, far-te-ás como uma nuvem para cobrir a terra, tu e todas as tuas tropas, e muitos povos contigo." (Eze 38.7-9)
As agressões de Israel aos povos vizinhos justificam-se, portanto, a meu ver, segundo dois argumentos: um religioso e um político. Acerca dos aspectos religiosos já nos debruçamos aqui, sabendo da importância daquele pedaço de terra desértica para os povos das três principais religiões monoteístas do mundo(judaismo, cristianismo e islamismo); mas o que de fato me preocupa é o argumento político, baseado num nacionalismo extremado, que apoderado por uma extrema-direita forte, que sucessivamente governa Israel, entre um e outro governo trabalhista, é que potencializa a fúria do Estado judaico, contra aqueles que contrariam seus interesses.
O nacionalismo é uma doença política. Em torno dele podem se reunir os desejos mais mesquinhos e os interesses mais egoístas. Segundo Hannah Arendt, nas Origens do Totalitarismo, foi mediante a leitura do Manuscrito dos Sábios do Sião, que defendia o nacionalismo judeu e o Estado judaico, que Hitler inspirou seu famigerado plano de desenvolver a ideologia nazista. O nacionalismo é exclusivista, não admite a diferença, e, em prol da busca e recuperação de um sentimento nacional (o que difere, em muito, do patriotismo) acaba por atiçar as paixões mais avassaladoras, levando multidões a funcionarem como bonecos automaticamente controlados, prontos a perpetrarem as maiores barbaridades. Foi assim no Conflito da Bósnia, nos Balcãs, nos anos noventa; assim como foi em diversos outros episódios da história mundial. O nacionalismo incita separatismos e a formação de grupos terroristas e guerrilheiros como o ETA na Espanha, ou o IRA na Irlanda do Norte, e numa sociedade globalizada, até hoje se perguntam os sociólogos e cientistas políticas, até que ponto uma manifestação nacional pode ser saudável ou não para o futuro de uma nação.
O povo palestino também é uma nação em busca de sua identidade nacional. E isso também é perigoso, não só para Israel, mas para o mundo; mas isso não deve servir de pretexto para justificar as atrocidades praticadas pelo Estado de Israel. Já passaram por Israel alguns governos com muito mais bom senso que o atual, e a última mancada do governo israelense, com um saldo de nove ativistas mortos, num navio em direção a Gaza, em águas internacionais, só justifica as piadas de judeu, que tomo a liberdade de reproduzir uma agora:
"Estava um cidadão judeu andando em Belfast, bem na época dos conflitos entre católicos e protestantes, quando tem a infelicidade de cruzar numa esquina com um suposto ativista do IRA. O cara pergunta com um fuzil apontado pra cara do infeliz:
-Responde rápido! Cátolico ou protestante???
-Não, não! Eu sou judeu! - Responde o assustado rabino.
O guerrilheiro dá uma risada, coça a barba e tira do bolso um turbante, dizendo: "Ahhhh, o senhor é judeu! Que ótimo! Pois hoje eu sou o árabe mais feliz da Irlanda!!!".
Gostaram da piada? Os nove corpos caídos num convés de navio às margens de Gaza, também não!!
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