terça-feira, 3 de agosto de 2010

REFLEXÃO: Natal, Walter Benjamin e eu.

Walter Benjamin é um dos últimos grandes pensadores da filosofia alemã no século XX, sem falar da contribuição de Heidegger e das teorias de Habermas, este último, com mérito, considerado um colossal gigante filosófico ainda vivo. Entretanto, voltando a Benjamin, este fazia junto com Adorno, Horkheimer e Marcuse um grupo intitulado Escola de Frankfurt, que bem poderiam ser os Três Mosqueteiros do pensamento filosófico com sua teoria crítica, acompanhados de seu D'artagnan judeu.

Sim, Walter Benjamin era judeu, e numa Alemanha atingida pelas sombras do totalitarismo e a ascensão dos movimentos nazifascitas, Benjamin tinha tudo pra se dar mal, por combinar em sua biografia tudo o que os carrascos nazistas mais desprezavam: ele era judeu, intelectual, e socialista. Ocorre que, como marxista, Benjamin reformulou alguns aspectos da teoria política de Karl Marx, adaptando-a à cultura.É digna de nota sua compreensão do fenômeno artístico como um instrumento de conscientização das massas, ao tratar do papel do cinema e do significado de "aura" na obra de arte, em seu livro mais famoso “A Obra de Arte na Época de sua Reprodutibilidade Técnica". Para Benjamin, à medida que arte tem dissolvida sua aura, seu manto de sacralidade, religiosidade ou dimensão aristocrática, ela se populariza, conferindo acesso às massas, e tende a se revestir de uma dimensão social, ou seja, pode mudar cabeças. Isso implica em dizer que no teatro a peça teatral revela-se na própria pessoa, na aura do ator, enquanto que no cinema e na televisão os atores se tornam secundários, acessórios, quando não dispensáveis, pois a relação do público não é mais com os atores, mas sim com o aparelho, com a máquina, com o aparato tecnológico que dissolve a aura da arte. Não é  à toa que nos dias de hoje, com a chegada da tecnologia 3D e o sucesso comercial do filme Avatar nos cinemas, o estudo de Benjamin ganhe uma atualidade impressionante. Mas, voltemos à condição de Benjamim enquanto pessoa, e porque eu estou falando dele.

Como eu havia dito antes, apesar de toda sua sensibilidade, bagagem teórica e cultural, Walter Benjamin acabou por ser considerado um pária em seu próprio país, incapacitado de lecionar assim que os nazistas chegaram ao poder e se tornou  mais uma vítima de um sistema opressor, assim como milhões daqueles que perderam a vida inutilmente no holocausto judeu. As circunstâncias que cercaram a morte do pensador berlinense ainda permanecem obscuras, mas tudo indica que ele se suicidou, ao tentar escapar do cerco nazista numa fuga desesperada  pelos Pirineus tentando chegar na  Espanha, vindo da França, país que o filósofo havia imigrado em 1933 após a chegada dos nazistas ao poder, mas que acabou sendo tomada pela avidez sanguinária de Hitler. Detido na fronteira franco-espanhola, ao saber que seguia entregue a Gestapo, Benjamin se suicidou.

Já falei aqui neste blog como as ditaduras podem seduzir os intelectuais, assim como estruturas de poder totalitárias podem, ao contrário, destruir qualquer tipo de oposição intelectual. Padecem sobretudo os sensíveis, aqueles realmente interessados na transformação e na revitalização de uma cultura considerada ultrapassada, e, por isso, são jogados no limbo do esquecimento ou nas galés dos maus tratos emocionais. Sei disso porque, assim como Benjamin, sinto agora isso na pele, ao me deparar com uma estrutura de Estado que não mais corresponde aos meus ideais e a um serviço que em muito me onera psica e intelectualmente, pois não é onde eu gostaria de estar. E sobre estar vivo, no paradoxo de viver agora em uma bela cidade, mas, ao mesmo tempo, não querer mais viver nela por sentir que a "aura" de que tratava Benjamin não existir mais pois que agora se despedaçou,  vejo que isso me traz uma consciência dolorida de classe e que me torna, necessariamente, um rebelde, um pária em minha própria cidade e no meu próprio emprego.

Explicando, sinto a aflição de Benjamin, um estudioso da aura da arte e alguém que via de fato racionalidade na beleza, pois ao ver  uma cidade tão bonita como Natal, eu pude descobrir o quão perversamente, nas mãos de seus governantes, de uma elite política e de uma camada burguesa provinciana, a cidade de minha juventude foi estragada por processos nefastos de urbanização, por uma multidão de carros novos, velhos ou importados que empesteiam e poluem a cidade de bela paisagem. Isso estraga qualquer cartão-postal, dissipando a aura de linda "cidade do sol", outrora imaculada na obra de arte, em verso, prosa, fotos e cantos.Num serviço público por vezes inoperante, e, sobretudo, ineficaz, vejo o quanto as trocas fisiológicas colocaram uma vez mais parvos ignorantes na chefia de órgãos públicos (de forma semelhante à ocupação de espaços no poder político pelos nazistas na época de Benjamin), de mentalidade ultraconservadora, extremamente burocrática, tecnicista, fordista, e que não aceitam contestação, transformação e, pelo contrário, lançam ao exílio de velhas e carcomidas repartições os interessados, todos aqueles que de alguma forma se tornaram diferentes, os exóticos, os esquisitos, os nerds. Natal é uma cidade de funcionários públicos, uma minimetrópole de interesses burocráticos e turísticos, onde se esconde por debaixo do tapete das belas dunas toda a perversidade oficial. Para todos os efeitos, quem sofre no serviço público são os intelectuais.

Algumas estruturas não são para intelectuais, e, dentre elas, considero para mim a segurança pública. Na qualidade de um servidor público que já sinto que não sou, sinto-me um judeu intelectualizado vítima de uma estrutura antissemita, de um fascismo dissimulado que se revela numa sicofântica "batidinha nas costas", de um bisonho método de extermínio de mentes através das câmaras de gás da indiferença. Sinto que minha fronteira através dos Pirineus da vida leva-me ao Rio de Janeiro, mas temo, mediante a perseguição que sinto que está sendo movida contra mim, se conseguirei alcançar a fronteira, antes de ser capturado, e ser entregue a Gestapo dos burocratas de plantão.

Assim como Walter Benjamin mantinha por influência familiar sua fé judaica, eu restabeleço minha fé cristã a cada derrapada do destino. Peço a Deus a libertação dos grilhões, a liberdade de consciência que me possa fazer tomar as decisões mais discernidas e acertadas possíves, mas, sobretudo, de ao mostrar meu peito aberto, não ser atingido pelas balas perdidas da intolerância, que os algozes de tocaia sempre se dispõem a disparar ao mover os dedos no gatilho, toda vez que sentem que algo diferente está por vir. Peço, apenas, aos meus queridos leitores do blog, sensíveis amigos e alguns conhecedores de meu problema que orem, ou torçam comigo, para que eu não seja mais uma cifra do holocausto de servidores públicos, jogados na humilhação do esquecimento ou banidos para sempre da existência, através de uma mera canetada dos agentes da opressão. Até breve e boa sorte para nós todos!

Um comentário:

  1. preto...obrigada pelos textos... sempre presentes...

    f e l i z

    a n i v e r s ar i o

    branca

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