domingo, 1 de fevereiro de 2009

Polêmicas sobre o criacionismo e o evolucionismo: diante de Deus nada se inventa, tudo se copia!

O colunista André Petry, em artigo publicado em recente edição de Veja, que saiu esta semana (edição 2098), em meio ao bicentenário de Charles Darwin, criticou a expansão do ensino do criacionismo nas escolas brasileiras, uma vez que esta teoria passou a ser lecionada como disciplina de ciências, no período da pré-escola até a quarta série. Polêmicas a parte quanto ao suposto caráter cientítico da teoria criacionista, resta comentar aqui quanto ao papel da religião e do histórico serviço prestado à ciência do autor da teoria da evolução das espécies.

O problema da crítica de Petry é que em seu ateísmo de forte linha liberal, o articulista da Veja rechaça toda e qualquer contribuição da religiosidade na condução dos discursos teórico-científicos sobre o desenvolvimento da vida na Terra e da humanidade. Para ele, colocar o estudo do criacionismo fora das aulas de religião e introduzí-lo como uma das correntes teóricas a serem discutidas nas aulas de ciências, é mera perda de tempo sem nenhum fundamento científico, que contribuíria para o embrutecimento intelectual dos filhos de pais crentes, que decidem colocar seus filhos nas instituições de ensino confessionais, que, porventura, lecionam tais estudos ( como por exemplo, o colégio presbiteriano Mackenzie, em São Paulo). Diz o autor do artigo que esse tipo de estudo passaria a confundir o aluno, não lhe dando discernimento sobre o que seria, de um lado: razão e ciência; e de outro: crença e superstição.

Em primeiro lugar, "tucanamente" falando, mas sem necessariamente adotar a posição de ficar em cima do muro, como os dignos representantes da ave ideológica de nossa cena política brasileira, eu daria uma de Antony Giddens (economista e cientista político inglês), e entraria com uma alternativa de "terceira via", que seria aquela mais conciliadora, adotada por muitos representantes da ciência e da teologia no mundo, independente das denominações, preferindo uma solução que envolvesse tanto aspectos interessantes do criacionismo, como também sem negar o legado e a forte contribuição da teoria das espécies de Darwin.

Trabalhando portanto, como um autêntico simpatizante das teses conciliadoras, entendo que a difusão do criacionismo não pode ser vista como um mal obscurantista a ocultar a verdade científica dos olhos de nossos alunos, como também não pode o próprio evolucionismo converter-se a um status tal de conhecimento inquestionável e rigoroso, a ponto da própria teoria darwiniana transformar-se, ela própria, em crença ou religião!

Ora, creio que o caro senhor Petry não tem conhecimento ainda que o curso de Teologia, não obstante estar efetivamente vinculado aos estudos de um ser inconcebível, incompreensível e impossível de evidência científica (sintetizando:Deus), tem seu reconhecimento aprovado e consagrado pelo Ministério da Educação e pelo CNPQ, como área das Ciências Humanas, estando catalogado enquanto tal, junto de outros ramos do conhecimento similares, como a Sociologia, a Economia, a Ciência Política e o Direito.

O saber teológico, salvo entendimento distinto e equivocado de seus detratores, é também saber científico, uma vez que a imponderável característica dos fatos humanos, merece (por que não) uma apreciação não apenas em termos de racionalidade, mas também em termos de fé, sob a ótica da crença. E quem disse que Deus não pode ser racional? Passou-se o tempo em que Nietzche criticava a religião em seu "O Anticristo", quando no século XX em diversos concílios da igreja católica, assim como setores da igreja protestante, passaram a se reconciliar com filósofos e cientistas, propondo uma compatibilidade entre fé e razão que não desnorteasse o conhecimento científico e nem importasse em sacrilégio ou heresia para os cânones da fé. Tal conciliação é possível e foi desenvolvida não agora no século passado, mas na verdade desde a contribuição infatigável de filósofos que foram reconhecidamente homens de fé, como também foram consagrados enquanto homens de ciência. Quem duvida é só se recordar da obra de Hegel, " A Razão na História", onde o filósofo alemão entendia que o desenvolvimento do ciclo histórico da humanidade era conduzido no sentido de conceber e realizar os propósitos de uma "ideia absoluta"(leia-se para um bom entendedor:Deus).

Hegel, assim como Kant, ambos pesos pesados da filosofia moderna, eram não apenas racionais homens de ciência, mas dignamente homens de fé, que concebiam a divindade não como algo mágico ou supersticioso como pensa André Petry, mas sim como uma categoria racional possível de elucubração e que estaria presente na produção do conhecimento sobre as coisas do mundo. Se não for assim, então alguém gabaritado me explique o que Kant quer dizer quando fala em sua "Crítica da Razão Pura", que o conhecimento do homem sempre ficaria limitado nas fronteiras de seu entendimento, porque sempre haveria um algo mais, um plus, contemplado pela racionalidade enquanto possibilidade de conhecimento, mas que estaria sempre encoberto ou inalcançável pelo entendimento dos homens. O que estaria, portanto, além do numeno ou "coisa em si", nos dizeres de Kant? Esses filósofos compreendiam que a transcendência fazia parte do conhecimento, e qualquer categoria de pensamento que se proclamasse uma evidência absoluta, estaria fadado a ser questionado em sua essência por algum imperativo da razão. Nesse sentido, falar peremptoriamente que Deus não existe até é válido enquanto um experimento argumentativo; porém, a validade desse argumento soçobra mediante o emprego do questionamento da razão, no momento em que me questiono por que não existiria se digo que não existe, uma vez que aquilo que não existe pode estar sempre colocado como algo que possa vir a existir. Daí a nossa incessante busca de conhecimento, daí a ciência, e por aí Darwin passou a desenvolver seus estudos, não querendo dinamitar a fé, e nem repudiar seus postulados, mas sim defender a tese de que dentro do que nos foi colocado enquanto possibilidade de criação ( ou seja, a imanência de um Deus possível que tudo fez), haveria dentro desse quadro a possibilidade de uma evolução das espécies, num período histórico e geológico que, necessariamente, não contradiz os artigos de fé, naquilo que se acredita como resultado da obra de um Criador.

Mesmo para quem não acredita em Deus, ou rejeita qualquer possibilidade de tese unificadora de saberes teológicos, oriundos da religião, com conhecimentos seculares, de natureza eminentemente laica e científica, vale salientar outros nomes na formação do pensamento moderno que também produziram obras em suas épocas, com forte influência de suas matizes religiosas. Afinal de contas, Baruch Spinoza era um cristão de berço judaico, Soren Kierkgaard era luterano e desejou ser pastor, enquanto que um Martin Heidegger em tenra juventude iniciou seus trabalhos filosóficos enquanto seminarista católico, quando depois passaria a dissertar no final da vida sobre o progresso científico e o advento da técnica, sem nunca esquecer da dimensão religiosa e imanentista de sua filosofia. O Islã também teve seus filósofos como Averróis e Avicena , que além de homens de ciência, também eram muçulmanos, com profundos estudos sobre a Criação e a natureza do homem.

Então, entendo ser bobagem ou puro "fogo de palha" a preocupação do senhor André Petry, em qualificar a iniciativa da rede de ensino brasileira, de introduzir o estudo do criacionismo nas nossas escolas, como um tipo de retrocesso. O que discordo, e aí concordo com a afirmação de Petry quanto à decisão da Suprema Corte Americana, é que não podemos ficar presos a um discurso neocom vivenciado pelo apogeu da direita religiosa norte-americana no malfadado governo Bush, que, diga-se de passagem, deu-se num contexto completamente diferente daquele vivido agora pelo sistema educional brasileiro. Vamos botar os pingos nos iiis, e, principalmente, entender que, pra quem acredita ou não acredita, tanto faz dizer que a terra tem 6.000 ou na verdabe bilhões de anos, pois Deus (se existir, para alguns) deve estar se rindo todo de tanta polêmica.

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