sábado, 28 de fevereiro de 2009

ESSE BALAIO GIGANTE CHAMADO PMDB






O PMDB é um partido engraçado. É a agremiação político-partidária nacional que a imprensa já atribuiu um sem número de significados. Desde "partido ônibus", "Centrão", "partido-noiva", simplesmente "monstro", e quantos adjetivos você quiser atribuir à tradicional legenda, oriunda do antigo MDB.

Vamos refrescar a memória! O Movimento Democrático Brasileiro foi parido pelo golpe militar de 64 após a estupenda machadada contra a democracia, a liberdade e os direitos fundamentais, que foi o AI-5 (Ato Institucional número 5), dissolvendo os partidos políticos existentes até então e toda a estrutura política-social que se firmava no país, até os militares obrigarem a nação a bater continência e entrar em ordem unida, perante o novo governo da turma de farda. Com a permanência no sistema político de apenas dois partidos: a governista ARENA e o oposicionista MDB, só restou a todos os demais grupos e militantes políticos, contrários à ditadura ou não agraciados pelos generais, migrar para uma legenda fabricada por decreto, que tinha tudo pra ser apenas uma mera figura decorativa num cenário político ditatorial, totalitário e de repressão ferrenha à liberdade de pensamento e de associação.

Contudo, o MDB cresceu e apareceu. Sob a batuta de políticos como Franco Montoro, Mário Covas e Ulysses Guimarães, na década de setenta a agremiação conseguiu obter algumas pequenas vitórias, dentro dos limites e de um surreal quadro possível de atuação política, dentro de um parlamento amordaçado, juízes amedrontados e promotores revoltados, diante de abusos e mais abusos da chamada "linha dura" do Exército, nos chamados "anos de chumbo" da ditadura militar. Estávamos nos primórdios da década de 70, e antes que a calça boca de sino desaparecesse da moda, a comemoração da vitória da Copa tivesse terminado, as discotecas chegassem e o comercial da pilha Rayovac fosse o mais visto, o pau comia solto, a cipoada era grande em torno de estudantes, artistas e intelectuais, a tortura com choques elétricos e pau-de-arara transformara-se num monótono expediente de repartição, e Lula e seus companheiros de sindicato nem sonhavam ainda em fazer greve entre os metalúrgicos do ABC paulista. Ficou antológica a candidatura extraoficial de Ulysses à presidência da república em 1974, mesmo sabendo que, pela Constituição da época, era impossível se candidatar, tendo em vista as cartas marcadas do colégio eleitoral, num país onde inexistia democracia. Era o anti-candidato, contra os "gorilas fardados" que estavam na selva de pedra, abatendo a tiros os Tarzans comunistas que se atreviam por gritar pela volta da democracia e da liberdade.

Agora, vemos em 2009 a volta do PMDB à cena política com todas as forças, voltando a dominar o parlamento, tanto na liderança da câmara com Michel Temer, quanto no senado, com José Sarney. É a volta do propalado "Centrão" de anos atrás, dizem alguns. Pra quem não é da época, esteve em Marte nos últimos 20 anos, ou nunca ouviu falar no termo, "Centrão" era o termo empregado pela velha "Nova República" para definir o grupo político majoritário que dava as cartas no Congresso Nacional, após a redemocratização, sendo responsável por todo nível de articulações políticas, conchavos e maracutaias que propiciavam o exercício do poder. Era um grupo formado por políticos sem muita afinidade ideológica ( ou seja, ora à direita, ora à esquerda), muito mais interessados em seus interesses particulares e corporativos, que poderiam tanto ficar em cima de muro, quanto apoiar uma proposta progressista de um grupo A, quanto outra proposta reaçonária de um grupo B, desde que isso resvalasse na consecução de seus interesses. O PMDB incorporou como ninguém esse apelido de "Centrão", tendo em vista que sua base política sempre foi uma colcha de retalhos, cabendo de tudo, desde arautos da democracia e combatentes da ditadura como Ulysses Guimarães, até espertalhões populistas e metidos até o pescoço com escândalos de corrupção e enriquecimento ilícito, como Orestes Quércia em São Paulo, Newton Cardoso em Minas Gerais e Antony Garotinho no Rio de Janeiro.

Com o ressurgimento do PMDB como grande força política nacional (na verdade, já era, porém uma força estilhaçada), não demorou para que o ex-governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, dissesse o óbvio: sim, o PMDB afunda na lama da corrupção, seus postulantes são todos interesseiros, interessados tão somente na disputa de cargos e o que vale mesmo para o partido é o poder, seja como for, mas tão e intensamente o poder, mesmo que pela porta dos fundos. Com a reforma partidária de 1979 e a volta da democracia na década de 80, o antigo MDB virou PMDB. Do que sobrou do partido histórico da década de 70 foi apenas o discurso de democratização mobilizado nas campanhas da Diretas Já, a formação de uma nova Assembléia Nacional Constituinte que gerou a atual Constituição de 1988, e o slogan da "Nova República", que o partido do velho Ulysses pretendia criar após a redemocratização, com Tancredo Neves na presidência. Quem ainda recorda dos livros de história sabe que, no último caso, o projeto dos pemedebistas babou!

O PMDB é uma pérola, uma jóia de originalidade no cenário político brasileiro, pela sua astúcia de ser o eterno postulante ao cargo maior da presidência, sem nunca o querer ter. Na verdade o PMDB é um partido parlamentarista por excelência, vide que nunca assumiu a chefia do Executivo federal de verdade. Depois que Tancredo bateu as botas, e um hesitante Sarney na fase do Plano Cruzado via-se às voltas com gado escondido nos pastos, pelo boicote dos fazendeiros e o ágio no preço da carne, uma desastrosa ocupação da siderúrgica de Volta Redonda pelo exército, durante uma paralisação de grevistas, que resultou na morte de operários, e tudo isso em meio a uma inflação galopante, o PMDB se viu na necessidade de não perder o bonde da história, se aliando a tudo o que é governo, seja ele qual fosse, numa estratégia que enfatizava muito mais a barganha com o poder, do que a conquista desse poder. Isso resultou no grande cisma que quase produziu a extinção do partido, no momento que seus notáveis na política paulista, pemedebistas históricos como Fernando Henrique Cardoso, Mário Covas e José Serra pularam fora do barco, abandonando a nau aos ratos, à mercê de Orestes Quércia e sua trupe, formando uma nova sigla partidária: o Partido da Social Democracia Brasileiro (PSDB, ou simplesmente tucanos) . Na debandada, depois os tucanos foram acompanhados de Aécio Neves, neto de Tancredo e ex-porta-voz da presidência, que hoje, como sabemos, iniciou meteórica carreira política nas Minas Gerais, tornando-se governador do Estado e hoje, é um dos postulantes do PSDB na sucessão de Lula, ao posto máximo do Palácio do Planalto.

O PMDB nunca elege um presidente pela legenda porque, na verdade, não precisa. Em seu parlamentarismo oficioso "à brasileira", as velhas raposas pemedebistas sempre estiveram no topo, movendo as peças do tabuleiro no xadrez político dos jogos de poder. Com a quantidade imensa de prefeitos e vereadores, do Oiapoque ao Chuí, formando exércitos de acochados, em milhares de currais e redutos eleitorais, o PMDB soube como ninguém posar de progressista quando não era progressista, ou aparecer como conservador, sem nunca ter sido conservador. Suas diferentes facções seja à esquerda, ou direita, ou se preferir, jogando dos dois lados, sempre constituíram o DNA político da legenda como partido da situação e da oposição vigente, tudo ao mesmo tempo. Quem acompanha as peripércias de nossos deputados nos bastidores de Brasília, sabe indicar nos dedos quem é a turma que aparece como petista dentro do partido, e aqueles cujos narizes ostentam aduncamente seus atributos tucanos. Se fosse no futebol, Michel Temer seria o típico líbero, aquele que você pode colocar até como goleiro, jogando em qualquer posição, cobrando os pênaltis de cada escândalo de corrupção de seus partidários, com um detalhe: você pode colocar ele pra jogar tanto no seu gol, quanto no gol adversário.

O PMDB não é partido de líderes carismáticos e centralizadores, como um PT com seu Lula da Silva, um PDT com seu finado Brizola ou até mesmo um PC do B, à sombra do fantasma de seu lendário líder morto, João Amazonas. O partido é uma confraria de interesses, um imenso agrupamento de corporações, um consórcio de interesses econômicos, políticos e privados de seus grupos internos. Um balaio de gatos onde quem canta de galo acaba por se ver sozinho, voltando cabisbaixo como um pinto molhado de volta para a casca do ovo. Que o diga Antony Garotinho, quem diria, o típico político espertalhão, o Romário da política fluminense, o "estuprador das esquerdas" no dizer de um indignado Brizola, que tentou impor sua candidatura pela segunda vez àquela agremiação política, fazendo até greve de fome, num episódio hilariante que não serviu para engordar seu capital eleitoral, e nem para emagrecer sua rechonchuda silhueta. Na época, a malandragem do garotinho custou caro, e a esperteza dos adultos prevaleceu, num puxão de orelha que resultou na saída do partido do ex-governador do Rio de Janeiro, pois para o PMDB, política não é brincadeira de garotinhos. Se anos antes o PMDB deixou a embarcação de Ulysses à deriva, nos 4% que resultou de sua pífia atuação eleitoral na polarizada eleição de 89 entre Collor e Lula, quanto mais ceder apoio da legenda a um neófito como Garotinho.

Eis que isso é o PMDB! Um retrato da realidade brasileira. O retrato pronto e acabado de seus políticos e das velhas formas de fazer política. Uma política preguiçosa, sem proposta de renovação ou transformação social nenhuma, mas tal como comida de hospital, algo que não escolheríamos e nem comeríamos, mas quando menos esperamos nos desce goela abaixo!

Não podemos esquecer do clã Sarney. Na verdade, o PMDB é um partido tão multifacetado, que conseguiu em seu interior agrupar as velhas oligarquias e clãs que dominavam a política do Nordeste, num coronelismo pop travestido de democrático, agrupando famílias que há decadas consomem nacos do poder na administração pública de estados nordestinos, transformando-os em verdadeiros feudos, suseranias onde a vassalagem dos súditos revela-se no clientelismo na distribução de cargos, no fisiologismo e nepotismo na acomodação de parentes, amigos e aliados em cargos do serviço público, contratos com lícitações fraudulentas ou privilegiadas, e um intenso jogo de "cartas marcadas", onde o interesse privado é de mais, e o interesse público é o de menos ou quase inexistente. Assim, o PMDB agrupou em seu berço as grandes famílias, como os Alves no Rio Grande do Norte (não sou parente deles, apesar de meu sobrenome), os Sarney no Amapá, outrora os Cunha Lima na Paraíba, assim como antigamente os Jereissatti, no Ceará, o grupo de Mão Santa no Piauí, e muitos outros grupelhos familiares espalhados em prefeituras e mais prefeituras dos cafundós do país. Sarney, ex-integrante da ARENA e de seu genérico, o antigo PDS, e vice na chapa de Tancredo, face uma composição com os militares, ao sair da presidência e posteriormente retornar à vida pública, abraçou a legenda de seus antigos adversários como seu novo lar. Pelo PMDB Sarney conseguiu o improvável, que foi burlar a lei eleitoral em sua época, elegendo-se senador pelo inexpressivo estado do Amapá, enquanto seus parentes conduziam a máquina política no Maranhão, e de lambuja presidiu o senado, gerando uma tradição de que ele, enquanto estivesse vivo, seria sempre o virtual ocupante da cadeira, sempre que as disputas políticas do senado, levassem o PMDB a indicar alguém para o controle da casa.

É bem verdade que é chato, e até mesmo ofensivo à democracia, ver que depois de tantos conchavos, alianças e jogos de interesses, o PMDB volta com tudo no cenário político, abocanhando de novo pedaços preciosos do poder, comandando novamente as duas casas do Congresso Nacional. Os caras praticamente hoje tornaram-se donos do parlamento, com direito à demarcação de terra e fixação de placa. Fica um gosto de laranja chupada pela segunda vez, após ter sido guardada na geladeira, ter que aguentar de novo (no, no, not again!) o Sr. Michel Temer com sua fala mansa de curió paulista, agindo como aquele zelador de prédio, que vê toda manhã o "Ricardão" sair mais cedo do prédio da patroa, e dizer que não viu absolutamente nada, diante do atônito marido preocupado, diante do rastro de cuecas estranhas e camisinhas jogadas pela janela ou pelo corredor do condomínio. Ou então ver o Sr. José Sarney, eterno"imortal" da egrégia Academia Brasileira de Letras, e também mitológico caudilho maranhense, a espraiar as tintas de sua caneta não apenas em seus contos da prosa telúrica do Nordeste, mas também para assinar a autorização para tramitação de projetos, com liberação de verbas para empreiteiras, destinação de recursos para a educação ou merenda escolar de seu estado, que nunca chegarão à boca de suas esfomeadas, esquálidas e desnudas crianças, das casas de taipa de Imperatriz ou Bacabal. Ver esses dois senhores novamente no comando do Congresso, é como ver a reprise daquele filme de sessão da tarde, pela enésima ducentésima vez, justamente na hora da fila do banco ou do dentista, sem ter nem um jornal ou revista Caras pra ler. Não dá, nem tem o maior tesão! Nesse caso: "Não vale a pena ver de novo"!

É o encontro do velho com o novo no eterno paradoxo da "Nova República". E eu que pensava que a república nova tinha começado de fato quando um ex-metalúrgico sindicalista tinha, por um partido de esquerda, chegado à presidência. Na lógica de aliancismos do governo de hoje, do alto de sua popularidade, em nome da tal governabilidade, vale para o governo conceder o Poder Legislativo inteiro a um partido, cujos integrantes tem tanta veracidade e tanta integridade de intenções quanto uma nota de três reais. Vão me dizer que o PMDB ainda tem pessoas distintas, administradores competentes e políticos sérios, de reputação ilibada, como um José Fogaça ou um Pedro Simon no Rio Grande do Sul, porém, eu retruco não falando mal e em particular de quesitos individuais deste ou outro personagem público ( a imprensa e a opinião pública já fazem isso direto), mas sim de um projeto político global que é representado pelo PMDB hoje. O PMDB em seu aliancismo a todo custo, tira da política tudo o que lhe restava de iniciativa militante pela mudança, de busca da transformação social ou, ao menos, de crítica a velhas formas de exercício do poder. O PMDB tira o tesão da política para aqueles que ainda consideravam que, mesmo tendo morrido o sonho da revolução de que tratava John Lennon, ainda fosse possível por passos minguados, fazer uma república ou trazer um novo Brasil mais atraente socialmente e menos feio que o nosso para as novas gerações. Com o retorno da velha guarda pemedebista à posse das chaves do portão de nossa democracia, só nos resta esperar quando é que alguma novidade vai aparecer nas ondas do rádio, pois nessa frequência, só escuto música repetida.

É, Doutor Ulysses! A exemplo do personagem homônimo, da Odisséia de Homero, foi bem melhor ficares no fundo do mar, junto às sereias, do que retornar a Ítaca para conviver com as górgonas, as medusas da política nacional! Quem saca literatura sabe do que estou falando!http://noticias.uol.com.br/ultnot/multi/2009/03/01/0402356CD0897326.jhtm?pmdb-e-zona-de-indistincao-de-psdb-e-pt-0402356CD0897326

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Coloque aqui seu comentário:

Gates e Jobs

Gates e Jobs
Os dois top guns da informática num papo para o cafézinho

GAZA

GAZA
Até quando teremos que ver isso?